Uma breve reflexão sobre a modernidade
Paulo Pires
Meu amigo Paulo Mascena, promoter, homem do show business e das artes, diretor do Centro de Cultura Camilo de Jesus Lima, enviou-me com a gentileza de sempre dois vídeos com a presença da soprano Ana Maria Martinez, do maestro Dudamel interpretando a música de Villa Lobos. Acho que isso bastaria para dispensar elogios e admiração.
Paulo é baiano, Villa Lobos, carioca (dois brasileiros), Ana Maria Martinez porto-riquenha e o maestro Gustavo Dudamel, venezuelano. A Filarmônica é de Berlim (será que é fraca?) e o ambiente onde foi feita a apresentação e gravação do DVD é simplesmente espetacular. Se somarmos a esses ingredientes uma platéia de altíssimo nível, concluiremos que o resultado é Obra de Arte em sua expressão mais elevada.
Quando terminei de assistir ao vídeo, comecei a me perguntar: Porque temos tanta música de qualidade à disposição e “o pessoal” insiste em ouvir e pagar prá dançar porcaria? Por que ir a uma grande festa e lá, diante de uma mesa com comidas e iguarias maravilhosas, optar por um cachorro quente? Será que é isso que chamam “questão de gosto?” Ou isso é mesmo falta de educação ou excesso de mau gosto? Não consigo entender que uma pessoa, em sã consciência, possa ter coisas boas à sua disposição e opte por aquilo que não presta. Nunca ouvi alguém dizendo que só gosta do que não presta. A não ser uma prostituta que conheci na Praça Tiradentes, no Rio de Janeiro há muitos anos. Mas, sinceramente, ando meio desconfiado que aos poucos “o pessoal” está fazendo questão de gostar do “que não presta”. Pelo menos se considerarmos o que está ocorrendo no cenário musical. Só se toca e se ouve e se pede porqueira. Honestamente, jamais pensei que chegaríamos a esse nível.
Isso é um absurdo, diria Gaguinho! Hoje, na Bahia, em qualquer ambiente público, aberto, não se ouve nada que valha a pena. Nosso Estado, verdadeira fonte da cultura brasileira, caiu no esgoto da música ruim, que não tem santo que dê jeito. É música “peba” prá todo lado e prá todas as horas. Os americanos que gostam de boa música e que conheceram o grande Dorival Caimi nos idos de 1957, ao chegarem aqui ficam espantados, pois sabem que nesta terra, surgiram gênios como o próprio Caimi, Elomar Figueira, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Alcivando Luz, Batatinha e mais um mix de artistas maravilhosos não alcançados pela mídia. Será o Benedito?
O que leva um País cair numa buraqueira dessas? Bem, é preciso dizer que os currículos escolares do ensino básico, a partir de 2010, salvo o engano, incluem agora educação musical. Será que o povo vai tomar vergonha ou continuaremos patinando em cima da coisa ruim? Não sei se vai dar certo. Na América do Norte, a música continua sendo ensinada nas escolas e a proliferação de música ruim por lá também não é pequena.
Creio que há uma tendência natural por parte do jovem de se insurgir contra as instituições estabelecidas. Jovem sempre foi historicamente um destruidor de mitos. Um iconoclasta. Claro que em alguns aspectos, isso é extremamente positivo. Mas em outros a coisa degringola e muita gente se perde e não dá em nada. Ou seja, muitos jovens que pensam “mudar o mundo” a partir de determinado momento começa a se repetir e, pior, repetir os mesmos erros dos seus pais e antepassados e acabam por não contribuir com nada que torne o mundo melhor.
E se algum jovem estiver pensando em mudar o mundo, caminhando pelas passagens equivocadas que estão à sua frente, adeus Bahia! Sinceramente, não vão conseguir. Ser jovem é realmente um estágio de vida maravilhoso. Mas é preciso entender que a jovialidade ou a modernidade não se materializam apenas pela idade. É necessário um conjunto de elementos que incluam estudos, aprendizado, reflexões, transformações, ações, disciplina, dedicação, respeito pela anterioridade e pela alteridade e mais um sem número de preceitos para realmente o jovem se tornar um inovador, um sujeito destacado, amado e respeitado. Nem todos conseguem isso.
Pois foi isso o que ocorreu com o jovem Villa Lobos. Estudou, se dedicou, se aplicou, farejou e inovou o mundo da música ao seu estilo e modo. E o fez com tanta confiança que resolveu apresentar seus desafios estéticos ao mundo da música européia e americana. Ao chegar a Paris disse logo, alto e bom som: “Não vim aqui aprender nada com vocês. Vim lhes mostrar uma nova música”. O “cara” era tão genial que percebeu desde cedo o que deveria fazer para se tornar um gênio e continuar sempre jovem. No vídeo a gente delira com a musicalidade da soprano. A porto-riquenha é uma artista espetacular. Parece até que tem a voz destinada a afinar diapasões. Fantástica. E o jovem maestro Gustavo Dudamel? Bem este é um caso à parte na história da música erudita moderna. É um menino (vai fazer 29 anos, no final deste mês de janeiro de 2010). Todas as referências críticas no campo da música clássica internacional conferem a ele apenas um adjetivo: Gênio. É o tipo do cara que nasceu, viveu e vai morrer jovem, mesmo que isso ocorra aos noventa ou cem anos. São grandes exemplos do que é ser moderno. Infelizmente há gente por aí, repito, que se acha moderno apenas no Pagodaço ou dentro do Tuc Tuc de uma boate. Deus há de ter piedade dessa gente. Até a próxima. E viva a juventude moderna. Aquela que associa juventude e modernidade a aspectos mais profundos e essenciais, levando a existência humana sempre em nível elevado.