Por Marco Anjo
Alerta! Fico repetindo a mim mesmo. Nem sempre a vigília funciona, mas conto com estranhas contribuições. Sempre que passo da hora de acordar, uma mosca me incomoda tanto que só me resta levantar. Quando me sinto livre, uma brisa passa. Quando meus pensamentos caminham no terreno do desinteresse, um bem-te-vi aparece às 11h. Quando Jhon lembra de mim, pássaros cantam um canto singular. Pareço contrário ao bom senso? Como explicar, então, uma borboleta pousar suas cores bem na ponta de um punhal? São as pequenas mágicas do dia, tão pouco examinadas. Vi um rapaz deficiente, mas o que ponderei é que ele era hábil, e lindo. E o jovem cabeludo? Vestia camiseta com a inscrição “Faço sexo seguro”. E o pastor de cavalos? Estava em lótus, sob a sombra de uma árvore florida. E o fantasma do planejamento cancelado? Alívio. E os pães de alho da Máxima? Tão bons quanto rever Rafa, do Odeon. E o trailer de Coco Chanel? Fico com sua expressão: “A moda passa, o estilo permanece”. E Cole Mohr? Gosto da cor dos olhos, da tattoo e da sua magra diversão. E a canção “I’m All Over It”, de Cullum? Acredito na tradução: “Olá Inocência! Parece que somos amigos há anos”. E minha ansiedade ontem? “Faz parte da condição humana”, disse um psicólogo. E a voz de Tam ao telefone? Anunciei, terminantemente: “Estou de volta!”. E Well? Mal se aproximou, mal se despediu, mas eu o registrei. E o garoto que sentou ao meu lado pra dissertar sobre a loucura? Ele tinha unhas feitas. E abrir a webcam pra Alex O.? Refleti um sorriso genuíno sob óculos wayfarer. E Alaïs que me pediu músicas com vozes femininas? O melhor foi ser lembrado. E o bêbê de Nani? O melhor foi ter sonhado. E o melhor da Levi’s? “Faça o melhor que puder e não olhe pra trás”. Alerta, então. Não quero pecar por apatia. Sonolência mórbida é o que parece sentir grande parte dos que estão em volta, dos ciclistas à alienada que me pediu cigarro. Um estado de letargia, de indiferença. Como aquele em que caem certos animais. Há uma escalada de violência tomando espaço, mas as pessoas parecem viver o sono profundo dos mortos. Pavor, insensibilidade, preguiça, paralisia espiritual? E Mona? Vai usar a voz e denunciar à Corte Internacional. E Quel? Usa a reflexão do medo, por Nino Bonder: “Uma pessoa espiritualizada é aquela que sabe caminhar pelas trevas. Concilia sentimentos e compreensões contraditórias e não estremece. O medo verdadeiro não paralisa, mas mobiliza. Ele ensina a urgência de enfrentar e não de fugir”. E Pedro Bial? Discursa: “Há um juiz implacável na cabeça, que condena cada gesto ou pensamento atrevido que se insinue. A pessoa se torna refém deste tirano mental. É a voz da consciência”. E eu? Escrevo e vivo, alerta.
3 Respostas para “Pílula 35”
sara
As palavras vêm unidas como uma cachoeira de pensamentos que nos atordoam em noites insones. Não há tempo para para respirar direito, nem para organizar as informações que brotam repentinamente. Mas ao contrário de Marco, costumo despertar às 6 da manhã e um estranho ímã, me segura na cama e me faz ficar ali pensando em milhões de coisas até dar as 7 horas. Nesse ínterim, tento ler um livro,mas a enxurrada de reflexões e questionamentos me desconcentra.
Às vezes chego a me perguntar se pensar demais faz mal…
Gostei do texto, Marco. Um grande abraço.
Alberto Marlon
Pensar é condição essencial à condição humana. Lembrei-me do filme Asas do Desejo… se pudéssemos – como os anjos do filme – “ouvir”o pensamentos dos que estão à nossa volta. Ah, que mar de sonhos e aflições!
Bom texto, caro Marco, tenho também este hábito, com a variante que dou um reload na memória ao fim do dia – apesar que, às vezes, confesso, dou alguns vôos em plena multidão. Bem, é isso.
Um abraço.
elva
Marco, Anjo que transportei….
Não me venha falar que sou suspeita, mas seus textos sempre me encantam pela profundidade e pelo senso reflexivo com que manifesta os seus pensamentos.
Eles fervilham a nossa mente e agitam os nossos dedos, despertando uma vontade tamanha de nos aproximarmos ao menos um poquinho de sua qualidade.
Se bem o conheço, nem preciso dizer para seguir em frente…sei que seguirá.
Orgulho-me de você.
Abraços da Mama Elva