Academia do Papo: “Universidade para feios: Uma crítica ginasiana a beleza e a moda”

Paulo Pires

O site Núcleo de Notícias de Vitória da Conquista ontem, 06 de maio de 2010, reproduz uma matéria da BBC Brasil, cujo teor é o seguinte: “As Universidades de Granada e Jaén (ambas no sul da Espanha) estão convocando mulheres feias para um projeto experimental científico. O objetivo é testar um tratamento psicológico que cure os transtornos provocados pela obsessão com o ideal de beleza inalcançável”.

É oportuno perguntar: Por que só mulheres? Avalio a opção exclusiva às mulheres como algo discriminatório e daqui envio o meu protesto. Na realidade estou me sentindo excluído e penso que o problema não é só meu. Mas, tudo bem. Vamos ao que interessa. Há alguns anos a Rádio Bandeirante de Vitória da Conquista realizou um Concurso em parceria com a Loja Nacional para eleger os três homens mais feios de nossa cidade. Adivinhem quem ganhou? Se você marcou Galego Pega Frete acertou na mosca. O segundo lugar ficou para outro amigo, o horroroso e mal humorado Argeu. Para quem não se lembra, este cidadão é aquele que se candidatou a vereador nos idos de 1990 e tomou uma das maiores bombas do nosso eleitorado. Sim, aquele mesmo do lema: “Quem comeu, comeu, agora é a vez de Argeu”. Na competição ele não conseguiu o primeiro lugar. Frustrado, iniciou uma série de contatos com advogados de forte presença curial para acionar a Rádio e a Loja. A intenção era solicitar ressarcimento por danos morais. Nosso “formoso” personagem considerava sua vitória líquida e certa. Por não ter sido vitorioso o que vimos ao final da história foi um sujeito alquebrado, desiludido e triste. Prá ser sincero, creio que depois de sua malograda candidatura ao posto de “o Cara mais feio da cidade” Argeu nunca mais foi o mesmo. De vez em quando nos encontramos e percebo em seu semblante traços de indisfarçável decepção. Acalento-o dizendo que no Reino de Deus “Os últimos serão os primeiros”. Ele ouve e fica calado…

            Se os pesquisadores espanhóis conhecessem nossos “mal-acabados homens” certamente ficariam desvanecidos. A tese sobre pessoas feias, que objetiva analisar distúrbios provocados pelos “descontentamentos normativos”, não resistiria a um primeiro teste de verificabilidade em nosso meio. Nossos homens feios são assim e se aceitam com a maior naturalidade. No caso de Argeu, ele mesmo confirmaria para a professora o que digo com o maior orgulho. E tem mais: Ele está louco para a segunda edição do concurso. Dessa vez, assegura-me, vai se “preparar mais”. Durma-se com um barulho desses…

            Sobre beleza convém lembrar os dissabores de Vinícius de Moraes que até morrer teve de explicar uma de suas mais famosas frases: “As feias que me perdoem, mas beleza é essencial”. Não se sabe se o Poetinha falou aquilo “de verdade” ou foi só de sacanagem. O fato é que as pessoas estão dia a dia mais preocupadas em se “parecer bonitas”. Fico pensando como deve ser a cabeça dessas pessoas. A angústia de viver sob o insuportável peso da beleza deve ser um inferno. Nunca me preocupei com isso, senão ficaria louco. Mas quem são os responsáveis por essa paranóia?

            Historicamente o homem ocidental atribui sua obsessão por beleza à velha Grécia apolínea, dionisíaca. A partir dos gregos a sociedade se impregnou desse conceito e até hoje dele não consegue se livrar. A conseqüência disso é uma sociedade impiedosa com os indivíduos. Estes, coitados, ficam a mercê dos ditames do coletivo. Muitos, a partir de determinado momento, sofrem por não acompanhar o que está acontecendo. A moda exige adesão e reprodução imediata. Não acompanhá-la significa sofrimento. A pessoa sente-se só, obsoleta, incapaz.  Todos querem ser bonitos e estar na moda. Triste daquele que não a acompanha.  A contradição maior se traduz pela diluição do caráter individual com inevitável perda de personalidade. O coletivo engole o indivíduo e este se sente feliz por “pertencer” a um grupo, uma tribo. Mesmo que seja ou esteja vivendo como um idiota, um alienado. Ora, pensa ele, “se estou na tribo, não devo ser diferente dos outros. Portanto, estou ótimo, reconhecido, sentindo-me bem e belo”.

            Adverte a professora Maria del Carmen Santaella da Universidade de Granada, titular do projeto: “O ideal de beleza transmitido pela família, amigos e mídia é tão rígido na nossa sociedade que chega a alterar a percepção que uma pessoa pode ter sobre o que é uma aparência normal”. Isso mesmo. Nossos jovens, mormente as moças, estão cada dia mais preocupadas em se transformarem em seres perfeitos. Um milímetro a mais no nariz tem-nas levado ao cirurgião plástico para consertar “o enorme desvio”. É uma loucura, como costuma repetir uma socialite carioca.

            Um ponto que chama atenção no projeto é que o tratamento dirige-se especificamente a moças entre 19 e 30 anos. Implica dizer que se fosse destinado também a homens eu estaria fora. Em outras palavras: mais uma vez excluído. Conclui-se daí que depois dos 30 anos, não tem mais jeito; estamos perdidos. Acho que foi Bernard Shaw quem disse: “Não confie em ninguém com mais de 30 anos”. Se não foi ele, pelo menos existe uma música de Marcos e Paulo Sérgio Valle assim falando. Shaw adorava ironizar a sociedade de sua época.  Especialmente os escravos da moda. Para esses ele disse: “A moda não é senão uma epidemia induzida”. Quanto à feiúra eu pergunto: você está satisfeito com o que tem no rosto e no corpo? Não fique triste se a resposta for negativa. Console-se comigo.  Cordiais saudações e até a próxima.


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