Direto da Praça

Quebra de Sigilo e as Cartas de Bernardes

Por Paulo Pires

A quebra de sigilo fiscal da filha do candidato José Serra está dando o que falar. Algumas editorias transformaram a questão em assunto de Estado. O que, em tese, não deixa de ser. Isso não impede, todavia, de se reconhecer que o jeito de abordá-la está transformando o fato em oportunismo político. Todos interessados no horário eleitoral [tem gente por aí que tem horror] estão percebendo que  a  mídia está ultrapassando os limites da questão. Por causa desse excessivo tratamento ao caso, está parecendo ao grande público apenas uma questão eleitoreira. Sendo assim, o problema perde seu status e vira um inconseqüente bate boca partidário.  Quebra de sigilo fiscal é crime, portanto, quando ocorre deve ser responsavelmente noticiada e consequentemente levada a instâncias que cuidarão do assunto. Parece que nossa grande mídia não insiste apenas com os encaminhamentos legais. A mídia quer politizar a questão. Nitidamente com intenção de explorar o assunto para que Serra saia do buraco. Isso é que é terrível. Mídia partidarizada. Viver em um país onde a mídia toma partido [no sentido político do termo] é muito grave. Quer dizer, é extremamente grave.

            Mas o leitor/eleitor atento aos acontecimentos verifica que a ênfase dada ao assunto é uma tentativa subliminar para conduzi-lo a votação diferente de sua escolha natural. É a famosa “sugesta” no melhor sentido carioca do termo, O Povão detesta o voto implacável, imposto, criado por agências noticiosas. Lamentavelmente o Brasil com a sua democracia restaurada há menos de trinta anos, ainda convive com elementos midiáticos que se intrometem nas decisões políticas como se fossem verdadeiros troncos partidários. É lamentável e deplorável que parte de nossa grande mídia ainda esteja a serviço de grupos políticos. Não se pode negar que isto seja antigo  no País. Para se ter uma idéia, transcrevo abaixo trecho do livro de Eduardo Bueno [Brasil: Uma História,] onde encontramos a narrativa de uma enrolada feita pelo Jornal Correio da Manhã, poderoso veículo de Comunicação na República Velha, lá pelos idos de 1920. Os fatos envolveram as figuras de Epitácio Pessoa, Arthur Bernardes, Nilo Peçanha, e Edmundo Bittencourt, dono do famoso Jornal:

            “Em 4 de novembro de 1920, depois de passar 5 anos na Europa, em companhia de sua jovem esposa Hermes da Fonseca retornou ao Brasil. Embora o País tivesse esquecido seu desastroso desempenho na Presidência, o marechal foi recebido como herói pelos oficiais do Exército. Desagradados com o comportamento “civilista” de Epitácio Pessoa, os militares descontentes vislumbraram em Hermes o líder ideal para dar início a uma reação. Em março de 1921, o marechal tomou posse no Clube Militar e deu todo apoio à candidatura de Nilo Peçanha, adversário da chapa  “café com leite” encabeçada por Artur Bernardes”

“Na edição de 9 de outubro de 1921, o jornal Correio da Manhã do Rio de Janeiro, publicou uma carta atribuída ao então candidato Artur Bernardes, na qual Hermes da Fonseca era chamado de “sargentão sem compostura”, Nilo Peçanha de “pobre mulato” e alguns generais de “anarquizadores”. A edição do jornal teve o efeito de uma bomba. Bernardes de imediato negou a autoria da carta. No dia seguinte o mesmo jornal publicou nova missiva – tão ofensiva quanto a primeira. No dia 27 de dezembro, peritos declararam que as cartas eram verdadeiras. O  Ministro da Guerra Pandiá Calógeras, informou Epitácio Pessoa que, caso fosse eleito, Bernardes “não agüentaria 24 horas no Catete”. Mas em março de 1922, Artur Bernardes recebeu 1,5 milhão de votos, contra 700 mil dados a Nilo Peçanha. Hermes da Fonseca foi preso e o Clube Militar fechado em 2 de julho. Setenta e duas horas depois, explode a Revolução Tenentista. Em maio de 1929, dois falsários confessaram ter forjado as cartas da discórdia”.

Como se vê, os factóides não são de hoje. Não se deve ignorar a grandeza opinativa do jornal Correio da Manhã. Ao mesmo tempo, não devemos esconder que o fato de este Jornal haver se metido em tantos conflitos só fez com que a sua vida sofresse solução de continuidade. Em 1974, totalmente em frangalhos pelas querelas que levou para si em relação aos militares, acabou encerrando suas atividades. De tanto se meter em questões político-partidárias foi tragado por elas. Um grande Jornal, o Correio da Manhã, mas se equivocou quando se enrolou [não com a Política]  mas com os políticos.  Na realidade deveria se enroscar com o Povo.  Mais uma vez está provado: O Povo Brasileiro é bom. Já a maioria dos nossos Políticos não merece o mesmo qualificativo. Em relação aos tempos atuais, especialmente a quebra de sigilo da filha do candidato Serra, parece que o próprio PT está gostando que ele seja tão divulgado. Ninguém merece…


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