A Praça é Nossa

Por Rita Pesce

(Uma homenagem a Pedro Dantas Moreira e a extinta Praça das Borboletas em Vitória da Conquista – Bahia)

 Caminhávamos juntos pela praça e eu segurava em sua mão.Em cada canto ele falava: fica ai! Pegava com carinho em meu rosto, um leve toque quase de dois dedos, levantava minha cabeça, sorria para mim e dizia olhe para ali! Indicava- me o lugar se afastava um pouco e uma luz se acendia.

 Ele falava: essa foto vai fica ótima! E íamos à procura de outro lugar. Qualquer ângulo da praça dava para belas fotos.

 Mais alguns passos e eu me sentia como pássaro aprendendo a voar e a olhar. E ele dizia,olhe ali… E com carinho ele escolhia a direção.

 Eu ia contemplando a praça, o parque, a Biblioteca infantil, o zoológico, a cidade dos pássaros, a fonte luminosa com águas de todas as cores. O macaco Cazuza e Simão.

 Segura em sua mão, me sentia dona da praça e do mundo, não tinha medo algum. A gente comia pipoca na praça, lambuzava o queixo de sorvete, melava os dedos com algodão doce, tudo era permitido.

            E no parque ele escolhia o balanço mais limpo e seguro, me sentava e eu sentia a dança gostosa do vento no rosto e uma tarde grande sem hora de voltar. E a vida ficava com cara que ela tem de verdade, mas que a gente desaprende a ver. Ele para mim tinha aconchego de colo de Deus, de banho de mar quando a água é quente e o céu é azul.

            Do lado ele eu sabia que os anjos existem e que só alguns são invisíveis.

            Do lado dele podia ser agosto, mas parece manhã de natal, do tempo em que a gente acordava e encontrava o presente de papai Noel. Ele tinha luz das estrelas que Deus acende no céu. Do seu lado eu não achava que o amor era possível, eu tinha certeza. Nosso passeio na praça era só alegria, o instante que riamos Deus estava dançado conosco de rostinho colado. E a gente ria grande que nem menino arteiro.

Ser pai, com toda profundidade da palavra é ser gigante e é assim que são nossos Pais,gigantes. Ser pai é fazer o que parece impossível, ser possível para o bem de seus filhos. Se chegamos até aqui é porque eles foram o grande alicerce.Quantas renúncias, quanta luta, quantas e quantas vezes pensamos em voltar, em parar mas suas palavras de força, de fé nos levava adiante.

William Shakespeare diz com muita propriedade o que meu pai era para mim:

Há certas horas que só queremos a mão no ombro,
o abraço apertado
ou mesmo o estar ali, quietinho, ao lado…
Sem nada dizer…
Alguém que ria de nossas piadas sem graça…
que ache nossas tristezas maiores do mundo…
que nos teça elogios sem fim…
E que apesar de todas essas mentiras uteis,
nos seja de uma sinceridade
inquestionável…
Que nos mande calar a boca
ou nos evite um gesto impensado…
Alguém que nos possa dizer:
Acho que você está errado, mas estou do seu lado

            Hoje tenho a consciência de que somos filhos do mundo e para o mundo e sentimos muitas vezes a separação deles e as vezes nos perguntamos, quando aconteceu essa separação?Na realidade fora a muito tempo atrás. Hoje tenho a certeza de foi naquele dia em que me vestiu a farda, colocou a merendeira, segurou na minha mão e me levou a escola pela primeira vez. Ainda me lembro quando vi aquela lagrima solitária rolar e fiquei sem entender, mas hoje entendo meu pai, “começava ali a nossa separação”.Hoje entendo perfeitamente este amor incondicional;hoje entendo este amor perfeito.

            Passarinho para aprender a voar tem que deixar o ninho, mas na hora que tudo não da certo é o lugar que podemos voltar.

           Vivi com meu pai lindos momentos, ele era presente, por isso que o  trago vivo no meu coração. A gente passeava juntos sempre,  lembro que muitas vezes seus amigos, que era muitos, especificamente aqueles que não me conhecia, parava e perguntava quem é essa moça bonita e ele falava: Minha raspa de tacho, a casula que chegou depois de muito tempo.

            Meu pai era assim: ele perfumou minha vida e de muitas pessoas, com sua luz e suas cores, seu perfume era tão gostoso, branco, tão delicado, que ele mudou de frasco, mas continua vivo no meu coração e de todos que ele amou.


Uma Resposta para “A Praça é Nossa”

  1. telma moreira

    Rita, parabens pela sua graduacao. Uma realizacao deslumbrante!

    Sua homenagem a tio Pedro me trouxe lembrancas… Foi escrito profundamente do coracao.

    Abracos, de Telma e familia.

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