Paulo Ludovico
Antes de começar o caso (ou causo) de hoje, quero agradecer às demonstrações de carinho dos que “curtem” os meus escritos. São crônicas que retratam fatos verídicos (diga-se de passagem). Um desses agradecimentos é para Dona Elza Souza e Dona Mariana Pinto (pinto!!!!!!???). Perco o amigo, mas não perco o comentário. As duas tiveram a coragem de confessar serem leitoras de todos esses causos. Pra todos vocês, aqui vai mais um. Quem me contou jura ter sido verdade. Um dito popular: “esse cabra é igual a peixe, morre pela boca”. Todo mundo já conheceu alguém assim. E, pra relembrar, não é preciso de muito rodeio, basta pensar um pouco… pronto, a imagem do brabo já está aí, batendo na memória. Morrer pela boca é aquele tipo que “tem opinião formada sobre todos e sobre tudo”. Na maioria das vezes, o indivíduo se acha dono da verdade. Numa prosa qualquer, surge a deixa, o infeliz manda ver, palavras bonitas chuviscam. Mesmo sem que uma pergunta tenha sido feita, a danada da opinião “pipoca de lá”. Doa a quem doer.
Outro dito popular: “pra esse sujeito ser considerado baixo, precisa crescer mais uns30 centímetros”. Essa é pros que se “esqueceram de crescer”. É o famoso baixo (e hoje não se pode chamar alguém de baixo, sob pena de processo judiciário. Você tem de referir a essas pessoas como “prejudicada verticalmente”) Aí, “mano véi”, foi baixo, a história é pra “dois mil anos”. Pra início de conversa, todo baixo é invocado, nojento (nojento no bom sentido), cheio de nó pelas costas. Um “baixinho” (e por esse diminutivo é por onde começam os problemas) me confidenciou certa feita: “todos querem zombar de nós, baixos. Só se referem à gente como… baixinho”. E não é que o danado tem razão? Baixinho é de doer. Se baixo, já é baixo, baixinho deve ser um “baixo menor ainda”. E os apelidos? Alguém vê um “baixinho”, e é aquela festa: “tamborete de forró”, “pintor de roda-pé”, “anão de jardim”, são apenas alguns deles. Dizem até que se altura fosse dinheiro, sujeito baixo seria troco. Brincar com o baixo é prato pra toda hora. Aparece um deles e tem quem saia com uma dessas: “fulano é tão baixo que pra conseguir subir na calçada, só se atravessar a rua correndo” (acho que é pra dar impulso pra subir o meio fio). Ou então: “o camarada é tão baixo que sentado num meio-fio, fica com as pernas dependuradas”. Não é sem razão que a maioria dos que têm baixa estatura passe a idéia de ser um sujeito “invocado”. Esse temperamento, tendendo para agressivo, não é outra coisa senão uma espécie de auto-proteção.
Pra nossa história ficar bem temperada, vamos juntar esses dois tipos numa só pessoa, o “sabe tudo” e o “baixo” (o baixinho, falo assim pra deixar o cabra mais “invocado” ainda).
A “mistura”, isto é, o sujeito baixo e falante, trabalhava (hoje deve ter se aposentado) no Banco do Brasil, em Conquista, numa época em que só havia a agência central. Acho que Hudson é o nome dele. Tratava-se de um baixinho daqueles “invocados”, que carregava, na época, a alcunha (apelido) de “cabo Oscar”. É que ele parecia ser irmão gêmeo de um militar de mesmo nome, que atuou certa época em Conquista. Nessa época, o gerente do BB, em Conquista, era o “seu” Lima. Aliás, foi seu Lima quem primeiro acreditou no potencial cafeeiro da Região. Como gerente, ele abriu as portas do banco, e os (cofres) para aquela nova lavoura, lá pelo início da década de 70. Mas vamos voltar ao rumo da nossa prosa.
Houve uma época em que o Banco do Brasil estava promovendo a transferência de alguns de seus funcionários. Uns saíam daqui, outros terminavam por aqui, aqueles iam pra acolá. E, nesse clima de troca-troca (no bom sentido, claro!), foi quando chegaram para trabalhar no BB em Conquista uns quatro ou cinco funcionários de outras localidades. Pra eles, já com a mão na massa, o expediente iria até as duas da tarde, quatorze horas, corrigiam sempre os mais compenetrados. Lá pela uma da tarde, chega pro seu dia de trabalho o “cabo Oscar”, o nosso querido Hudson. Ele era caixa. Funcionário dos bons, pegou logo no batente. Atende um daqui, outro dali (na época a coisa era mais complicada, não havia a ajuda da informática), vai até o arquivo, confere a assinatura de um cliente (era no cartão de autógrafo), brinca com alguém, diz uma “piléria” pra outro e, assim, começa, pra Hudson, aquele dia que não deveria ter existido. Observador como ele só, o “baixinho”, de pronto, percebe gente estranha no pedaço. Conter-se, pra não fazer um comentário qualquer, poderia ser comparado a um ato heróico, de sacrifício extremo. Colegas mais próximos até se afastaram dele, afinal, um comentário qualquer (geralmente constrangedor) poderia “pipocar de lá”. E assim vai passando o tempo, Hudson, na sua rotina, examina uma ficha, confere um saldo, faz uma anotação, vai, de novo, até o arquivo, e pronto, é aí que se arma toda a encrenca. Ao seu lado, dois dos transferidos, um homem, à sua esquerda, e à direita, uma mulher. Feia de lascar. “Pra voar só falta a vassoura”, pensou Hudson, comparando a mulher a uma bruxa. Um palito que andava e, pra piorar o quadro, a danada era corcunda. Hudson já não se agüentava mais, tal era a vontade de zombar daquela coisa. As pernas dela eram um caso à parte, de tão finas, apenas uma banda da meia-calça bastava. Metade desses “atributos” da dama já seria suficiente pros famosos comentários do velho Hudson. O espantalho, ou melhor, a mulher (que também era caixa), depois de verificar a autenticidade de uma assinatura, volta pro atendimento. Hudson não se fez de rogado, vira-se pro camarada à sua esquerda e diz:
– Amigo, umas transferenciazinhas, né?
O colega (que parecia não gostar de muita conversa) fez apenas um leve movimento com a cabeça. E Hudson, indiscrição pura, continua:
– Amigo, parece que os diretores do banco não gostam muito da agência de Conquista.
Com um olhar, apenas, o colega parece perguntar porque. E Hudson, interpretando aquele olhar como se fosse um pergunta, continua:
– Você viu aquilo? Que mulher feia, de doer, mandaram pra nosso convívio? Acho que nem vivendo duzentas vidas, ela encontra um macho. Quem vai querer?
O colega, com cara de poucos amigos, responde:
– Em primeiro lugar, não sou seu amigo e, em segundo, fique o senhor sabendo que ela é minha esposa.
Hudson quase perde, completamente, o rebolado. O primeiro impulso foi o de dar os pêsames pro sujeito e, em seguida, se enterrar de cabeça no chão, mas, refeito do dissabor, sai com essa, depois de respirar fundo, aspirando todo o ar de que seus pulmões foram capazes:
– Moço, sua mulher é feia. Mas é muito gostosa!
Uma Resposta para “Feia…Mas nem tanto”
Mariana Pinto
Oh Paulo amo suas crônicas dou tanta risadas com elas.Continue publicando viu???? Adorei você ter colocado meu nome nos agradecimentos.Você esta de parabéns. Abraços Mariana