Por Paulo Ludovico
Existe por aí muito cabra, danado de prepotente. É o tipo do sujeito que, em cada uma de suas atitudes, faz valer a expressão: ”pensa que tem um rei na barriga”. Conheço uma “distinta advogada” assim. Ela, sem gastar um centavo sequer (na “saliva”, diria meu pai), passou um verão inteirinho na casa de praia de um amigo (que por sinal é meu amigo também e me relatou essa passagem). Uns vinte dias depois, esse amigo a encontra no Fórum e, ingenuamente, com a pureza que lhe é cotidiana, pergunta:
– Fulana! Onde fica o cartório tal?
Ela responde, na bucha:
– Fulana, não! Doutora Fulana!
É de lascar! Esse tipo de gente, quase sempre, olha as pessoas de cima prá baixo, como se fosse um ser superior. Um amigo, certa feita, disse, referindo-se a um sujeito, assim:
– Esse cara não se acha, ele se tem certeza.
Muito bem, o nosso caso de hoje é sobre um desses caras, que pensam ser superiores (não andam, deslizam). Olham “prás” pessoas por cima do ombro. O nosso protagonista acabara de se aposentar, depois de uma longa carreira como juiz e, depois, como desembargador. Não estou afirmando que juízes e desembargadores sejam assim. O brabo, desse nosso caso, é que era assim.
Recordo-me de um professor, juiz aposentado, que atuou em Conquista (esse sim, a humildade em pessoa), o doutor Juraci Barbosa Lima, que tive a honra de conviver por um período. Ele, brincando com os alunos, perguntava:
– Qual a diferença entre um juiz e um desembargador?
Diante do silêncio da turma, respondia, com um enigmático sorriso nos lábios (claro, onde mais ele poderia ter um sorriso?):
– A diferença é que um juiz pensa ser Deus, já um desembargador tem a certeza de quê O é.
Pois muito bem! O nosso desembargador aposentado é um desses, que pensam (ou melhor, têm a certeza) ser a personificação de Deus, na Terra. Isso, mesmo depois de aposentado. Ele atuava, também (e disso não se aposentara), como professor no Curso de Direito de uma determinada Universidade Federal. Depois de certo tempo, passou a “dar” aulas em uma Faculdade particular. E foi justamente lá que se deu esse caso. O professor ainda não sabia identificar os alunos pelo nome. É que ele acabara de assumir a cadeira. Depois de uma ou duas semanas de aula, só para completar a carga horária da turma, chegou o dia da prova final. Com a empáfia que lhe era peculiar, ao entrar na sala, o “deus” foi logo avisando:
– Senhores! São dez horas e dez minutos. O término da prova, impreterivelmente, é ao meio-dia. Nem um minuto a mais. Não vou admitir que qualquer um dos senhores faça qualquer rabisco, por menor que seja, após esse horário que defino como limite.
A prova começou e foi se desenrolando, dentro de certa tranqüilidade. Ninguém ousara “pescar”, nem uma “olhadinha” para o lado, por menor que fosse. É que a “fera” estava lá, atenta a tudo. Acredita-se, até, que muitos alunos mal respiravam.
Vez por outra, o professor, para aterrorizar a turma, vociferava:
– Quero ouvir o barulho do silêncio!
O nosso professor só não contava com um determinado aluno do curso, o Janjão (apelido dado por um irmão mais novo). O nosso Janjão era aquele tipo comum, nada que chamasse a atenção. Passaria despercebido se não fosse pela inteligência e pelo raciocínio, extremamente rápido. Respondia uma questão aqui, outra ali e mais outra acolá. Faltavam uns dez minutos para a hora fatídica e Janjão ainda não respondera a três questões.
– Estavam difíceis. Dissera ele, depois.
Pronto, mais uma (se estava certa, eram outros quinhentos). Mais um esforço e só faltava uma. Janjão olhou para o relógio: meio-dia, em ponto. O professor, em voz firme e ameaçadora, deu um ultimato:
– A partir de agora, ninguém escreve mais nada! Entreguem-me as provas!
Todos se levantaram e, um a um, foram entregando as provas. Quarenta alunos ao todo, o que demandou certo tempo. Só Janjão continuou sentado e respondendo àquela última questão, sem qualquer temor em relação ao aviso do professor. Aliás, atitude que, de pronto, foi percebida e, lógico, desaprovada pelo desembargador aposentado. “Se esse mocinho acha que vou receber a prova, está muito enganado”, pelo menos é o que imagino ter pensado o mestre. Depois que o último aluno (dos que se levantaram) entregou a prova (o relógio já marcava meio-dia e dez minutos), Janjão, calmamente, se levantou, com um gingado que lhe era peculiar (tal qual malandro carioca), caminhou até a frente da sala e, senhor da situação (pelo menos ele achava), estendeu, debochadamente, a prova ao professor. O mestre, tal qual uma fera ferida, sentenciou:
– Não quero sua prova, meu jovem! O senhor extrapolou o tempo! Portanto recolha-a.
E acrescentou:
– Obviamente o mocinho já sabe qual vai ser a nota.
Janjão, com a presunção de que o professor ainda não sabia o nome dos alunos, armou-se do olhar mais ameaçador de que era capaz e em voz alta e firme, encarando o professor face a face, perguntou:
– O senhor, por acaso, sabe com quem está falando?!!!!!
O professor, mais ameaçador ainda, de fazer inveja a seus tempos de juiz, de desembargador (ou as duas coisas juntas), berrou:
– Não!!!!!!
Janjão, numa rapidez de fazer inveja ao mais veloz dos velozes lutadores ninjas, suspendeu parte do monte de provas que estava sobre a mesa e, depois de inserir a sua no meio delas (tal qual uma carta no baralho), disse, ao mesmo tempo em que saia da sala (correndo, é claro!):
– ENTÃO DESCUBRA, SE FOR CAPAZ!!!!
Uma Resposta para “Descubra, se for capaz!”
Rafael
Isso é normal, principalmente em Vitória da Conquista.