O Cinema de Vitória da Conquista: cem anos homenageados em vinte

Por Marcelo Lopes

Cercada por um muro simples, coberto com palhas de coqueiro, o primeiro espaço de exibição de Vitória da Conquista tinha um o cinematógrafo manual com um aparelho gerador da luz do projetor à carboreto. Era 1912 e a casa de exibição de propriedade do Sr. Jacinto Sampaio, na Travessa Coronel Pompílio, atual Zeferino Nunes, inaugurava uma era importante da sociabilidade conquistense. A magia daquele cinema, ainda mudo, formou gerações inteiras. Os demais espaços que se seguiram a partir de 1917 (Cinema Jurandyr, o Cine Iris, Cinema Ideal, Odeon Cinema, Cine Conquista), foram fundamentais para a fixação de uma atividade cultural que congregava famílias mais diversas; dos mais humildes aos mais ilustres, com ingressos que variavam de um a dois mil réis para adultos e a metade para os de menor idade, de acordo a espécie do filme a ser exibido.

Vitória da Conquista chegou a ter cinco salas de cinema funcionando de vento em polpa – e simultaneamente – na década de 1970: Riviera, Glória, Eldorado, Madrigal e Trianon. Afetados pela nova conjuntura nacional e mundial, um a um estes cinemas de rua foram fechados, tendo seus espaços transformados em comércio ou igrejas evangélicas. Isto devido principalmente a mudança da relação do espectador com o filme, seja pela popularização dos suportes técnicos de exibição como o vídeo cassete, seja pela transformação no perfil de consumo de cinema em salas de exibição voltadas para a dinâmica dos shoppings centers.

Exatos oitenta anos após a primeira sala de cinema em Conquista e depois das experiências de cineclubes como o Glauber Rocha, na década de 1970, do próprio Glauber como cineasta internacionalmente reconhecido, e de inúmeras tentativas de manter a paixão de cinema viva em experiências coletivas e individuais, nascia no final de 1992, na Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, o Programa Janela IndiscretaCine-Vídeo Uesb. A iniciativa se inaugurava pela inquietação cinematográfica de dois técnicos administrativos da instituição, Jorge Melquisedeque e Esmon Primo. Curiosamente, a ideia não surgia, como se poderia esperar dentro de uma universidade, pela proposição de alguma iniciativa acadêmica e sim pelo notório saber de cinéfilos em ação. Essa característica demonstrou, desde sempre, a essência de uma experiência movida pela paixão e reconhecimento do valor social da sétima arte. Ao longo do tempo a prática que se tornou projeto alcançou importantes marcos na história recente do audiovisual conquistense. Faço um parêntese aqui porque é impossível para mim falar de forma distanciada deste ponto em diante. Fui frequentador assíduo do Janela desde 1992 e, em 1994, passei a integrar o Programa. De 1996 a 2007 participei com membro da equipe coordenadora ao lado de Jorge, Esmon, Milene Gusmão, Raquel Costa e Euclides Mendes, além de Alzilene Silva, Michelly Antunes, Lino, Henrique, Eduardo Eugênio e Georgen, somente para citar alguns de meus contemporâneos. Muitas outras pessoas integraram o projeto em todos estes anos e seria grande a lista para enumerar. Em comum, no entanto, a mesma paixão e inquietude em relação ao cinema.

De um projeto inicialmente ancorado apenas na extensão acadêmica, o Janela se desdobrou naturalmente em ações de ensino e pesquisa, estendendo suas potencialidades. Colabora hoje com conquistas formidáveis nos programas de graduação (possibilitando, inclusive, a criação do curso de Cinema e Audiovisual em 2010) e pós-graduação da instituição, graças, sobretudo, ao olhar atento de sua coordenadora geral, Milene Gusmão. O Janela alcançou o respeito e a admiração em todo o país pelas suas inúmeras contribuições para a formação de multiplicadores das ideias do cinema e do audiovisual como fonte de conhecimento e espaço de debates importantes nas mais diversas manifestações da economia da cultura, além de se tornar referencial de formação de público, sobretudo para o cinema brasileiro. Este ano, no dia 27 de Novembro, o Janela Indiscreta Cine-Vídeo Uesb faz vinte anos ao lado do centenário da história do cinema em Vitória da Conquista. Uma celebração pessoal para muitos e abrangentemente rica para toda uma região que pode experimentar o olhar generoso sobre uma arte e uma prática reveladora da nossa própria identidade e potencialidades. Convido-os a comemorem conosco com este mesmo olhar generoso sobre tudo o que se pode aprender com o cinema.


5 Respostas para “O Cinema de Vitória da Conquista: cem anos homenageados em vinte”

  1. Sahid

    Esta otima esta reportagem

  2. ferreira

    Belíssima reportagem que nos lembra as matines aos domingos acompanha dos picolés do bar Lindoia. Não sei se estou correto mais se não me falha a memoria o cine TRIANON (Av.Itabuna), substituiu o ELDORADO (av. Presidente Dutra -hoje integração). Agora uma pergunta porque o cine RITZ não foi mencionado na relção dos cinemas de nossa cidade? ele que alem de cinema foi tambem palco de grandes programas de auditorio comandados por J.Menezes uma lenda viva de nossa cidade. Caso eu esteja correto seria ótimo fazer uma nova reportagem, inclusive servirá para amadurecer mais ainda a idéia da reativação do cine Riviera, o que acho um idéia exelente.
    Parabéns

  3. ferreira

    Belíssima reportagem que nos lembra as matines aos domingos acompanha dos picolés do bar Lindoia. Não sei se estou correto mais se não me falha a memoria o cine TRIANON (Av.Itabuna), substituiu o ELDORADO (av. Presidente Dutra -hoje integração). Agora uma pergunta porque o cine RITZ não foi mencionado na relção dos cinemas de nossa cidade? ele que alem de cinema foi tambem palco de grandes programas de auditorio comandados por J.Menezes uma lenda viva de nossa cidade. Caso eu esteja correto seria ótimo fazer uma nova reportagem, inclusive servirá para amadurecer mais ainda a idéia da reativação do cine Madrigal, o que acho um idéia exelente.
    Parabéns

  4. Petista orgulhosso

    Gostei dessa reportagem!

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