Por Ricardo Marques
No ano 404 d.C. o imperador Flávio Honório proibiu definitivamente o que, até então, era uma das maiores diversões dos romanos durante cerca de sete séculos: a luta entre gladiadores. Antes disso, o Imperador Constantino I já havia tentado, em 325 d.C. extinguir essa modalidade de luta. O Gladiador era um lutador profissional que se apresentava nos coliseus e outros anfiteatros do império romano. Nos anos 80, os compositores conquistenses Rosemberg Oliveira e Anselmo Cerqueira retrataram muito bem esse período na canção “Coliseus”. A música foi premiada em vários festivais regionais e chegou a ser executada com excelente sucesso nas nossas rádios locais.
O ímpeto humano e o desejo de extravasar sentimentos internos a partir de embates não acabaram com a proibição do Imperador. Cada civilização, antes e depois do episódio dos coliseus encontrou alguma forma de exercitar a violência, mesmo quando somente assistida. Na Espanha, até os dias atuais, as touradas são ainda muito cultuadas. No Brasil, mesmo com a proibição da briga de galo, temos ainda as vaquejadas e outros esportes violentos com animais e até mesmo com pessoas. Mas a maior parte dos adeptos da luta migrou sua atenção para o esporte de competição. Isso pode explicar o sucesso que faz o futebol em nosso país. Na canção, inclusive, uma das mais fortes frases é a que diz que “os grandes estádios são os novos coliseus”.
As tradições humanas vão se transformando ao longo do tempo, mas seus resquícios ainda permanecem e só a história é capaz de explicar a aceitação de determinados modelos. Um desses resquícios veio parar na nobre atividade da política. Como grupos de ideologias e interesses comuns acabam se reunindo em defesa de suas propostas, isso desde sempre, o modelo democrático trouxe em si a necessidade de escolhas. É a forma que temos para eleger nossos representantes, a partir da análise dos seus projetos para o cargo que estão concorrendo. Os debates políticos surgiram dentro deste contexto. Foram frutos do advento da televisão e no Brasil, iniciaram-se, com mais ênfase, nas eleições de 1982, apesar de algumas tentativas em 1960 e 1974 e foram idealizados a partir do modelo americano de televisão.
Na história recente do Brasil, a partir do retorno da democracia, os cidadãos e cidadãs voltaram a ter o direito de voto e as eleições começaram a acontecer em todos os níveis. O modelo de debate político voltou a ser usado. Temos momentos inesquecíveis, como por exemplo, o que definiu as eleições de 1989 onde estavam em disputa pela presidência da República os candidatos Fernando Collor e Luís Inácio Lula da Silva. Muitos admitem hoje a manipulação ocorrida naquela fatídica eleição de 1989.
O debate caiu no gosto popular e se tornou uma forma de colocar os postulantes a um determinado cargo, frente a frente, para “teoricamente” mostrar à população quem está mais “preparado” para exercer uma função pública. Mas, quem é o mais preparado do debate é também o mais preparado para governar? O dono do discurso mais sintético, agressivo e tocante é o que sempre terá vantagens em um debate. Mas, cinco minutos (é esse o tempo médio de respostas para uma pergunta em qualquer debate) são suficiente para apresentar propostas concretas sobre temas tão complexos como educação, saúde, cultura ou mobilidade urbana? Cada resposta do candidato é precedida de aplausos ou vaias dos grupos presentes, uns apoiando outros fazendo oposição. Um verdadeiro teatro.
Com a consolidação e o amadurecimento da democracia no Brasil, o modelo dos debates precisa evoluir. Hoje, os problemas são mais complexos, bem como a sociedade e as políticas públicas precisam dar respostas a questões cada vez mais interligadas, onde é necessário por parte dos candidatos explicitarem suas ideias em espaços mais adequados e tempo mais amplo. Vivemos no tempo das redes, conexões, da interdisciplinaridade, dos projetos intersetoriais. O modelo de debate favorece quem não tem projetos e usa a palavra, a partir de frases prontas ou agressões diretas, para criar um clima de embate só visto nas lutas e no esporte. Mas política é coisa séria e é uma das atividades mais nobres do ser humano, quando feita com compromisso e ética.
Precisamos avançar nossos modelos de diálogo democrático com a sociedade. A política para ser levada a sério precisa estar presente nos processos de construção real. Ouvir integralmente as propostas de um candidato requer estudo, detalhamento, paciência e compromisso com a sociedade. Conhecer melhor os candidatos não se faz em uma hora. É preciso conhecer o seu passado, o seu presente e quais as suas verdadeiras intenções dentro do cargo a que se propõe exercer. No nosso município, as rodas de conversa, as plenárias do orçamento participativo, as conferências e os conselhos são exemplos de um novo modelo de democracia que se consolida no país e que precisa chegar forte nos momentos mais importantes do processo democrático, que são as eleições. Os sites dos candidatos, os programas eleitorais, as discussões nas redes sociais e os seus programas de governo vão se complementando e construindo a decisão do voto. Principalmente nas eleições municipais, que definem os gestores do lugar onde vivemos e nos relacionamos.
A sociedade evolui e precisa de novos modelos para acompanhar o seu desenvolvimento. Precisamos fazer da política o alimento diário de construção da liberdade, da igualdade e da fraternidade entre as pessoas. Reformulando modelos, estaremos construindo campanhas eleitorais cada vez mais consistentes e mais próximas do avanço democrático que estamos experimentando no nosso país.
Ricardo Marques é Administrador, Especialista em Saúde Coletiva e Mestre em Meio Ambiente e Desenvolvimento. Leciona as disciplinas Gestão Pública e Análise e Avaliação de Projetos. Atualmente, exerce o cargo de Vice Prefeito municipal de Vitória da Conquista, Bahia.
2 Respostas para “Os debates políticos e a evolução da democracia”
Adelson
creio de um dos miores desafios da democracia na atualidade estar no FISCALIZAR quem elegemos, muito bonito o discurso de quem insentiva o voto, porém a obrigação de votar implica em obrigação de fiscalizar, porém poucas são as ferramentas acessíveis a todos que dão condição de acompanharmos o mandato dos nossos políticos, nesse contexto temos os conselhos, mas muitas vezes, instituições sem qualquer autonomia, povodas de pessoas sem compromisso(já vi conselho de saúde onde os representantes dos usuários, serem cidadãos que não usam o serviço, assim sendo não conhece a realidade de quem estar representando ou os representantes dos servidores da saúde serem servidores contratados e por medo de perder o emprego se calar em face de situções que deveriam se revoltar, desta forma é mais que urgente dar mais poder de representação ao povo a fim de que a democracia seja em fim consolidada.
ASSOCIAÇAO CAPS II
NEPOTISMO EM ViTORIA da CONQUISTA!
COORDENADORA DO CAPS II MARIA APARECIDA CORTES CARGO DE CONFIANÇA É ESPOSA do FISCAL DE RENDA FUNCIONARIO EFETIVO DA SECRETARIA DE FINAÇAS REGIS CORTES.