Minha caminhada na Olívia Flores II

Paulo Ludovico

Pensei que não escreveria novamente sobre em minhas caminhadas na Olívia Flores. Mas, depois, refleti: se existe Rambo I, II, II e IV, Duro de Matar, da mesma maneira, Tropa de Elite I e II, posso também escrever uma sequência dessas caminhadas, que intitulo “Minha caminhada na Olívia II”. E vou parar por aí, a não ser que surja um novo acontecimento que mereça ser contado.

Nessa última segunda-feira (17), uma série de compromissos para o período da tarde levou-me a optar pela caminhada, no iniciozinho da manhã. Acordei cedo, pouco mais de 6 horas, e já pulei da cama, sem parar de saltitar (para aquecer os músculos, afinal não tinha costume de andar pela manhã). Saltitando, escovei os dentes e sai (o café da manhã, deixei para a volta). Sempre vou de carro até o antigo Instituto São Tarcísio. Ainda na garagem pensei, tenho de colocar uma música agitada (pra não perder o aquecimento). Escolhi “Cara Caramba Caraô”, da Chiclete com Banana. Bell (o cantor) parece ter entendido as minhas necessidades esportivas e já entrou na parte mais acelerada da música, o que me fez dirigir praticamente dançando (já que não podia saltitar). Estacionei no local de sempre, marquei a hora de início da caminhada e, “perna pra que te quero”.

Como, nas costumeiras caminhadas da tarde, não havia mais encontrado aquela idosa do caso anterior (se você não leu, leia), achei que ela poderia estar caminhando pela manhã. Insistentemente a procurei, afinal teria que testar se havia evoluído em minhas caminhadas desde aquela primeira e única vez em que a vi. “Talvez tenha mudado o local das caminhadas ou tenha desistido delas”, pensei. Vou eu, absorto em meus pensamentos revanchistas, já chegando à Coelba, quando, de repente, a uns cinqüenta metros à frente, vejo sair de um carro um atleta, para dar início à caminhada. Mesmo com a distância, percebi se tratar de um sujeito alto e extremamente gordo. Um médico (aquele do caso passado), vendo aquele sujeito imenso, teria diagnosticado com um sorriso sádico, próprio de quem gosta de ver o sofrimento do paciente (há médicos assim, neles, esse prazer é quase que “orgásmico”): “obeso mórbido” seria a conclusão. E ele teria razão, no mínimo, aquele atleta senhor (se eu colocar “senhor atleta”, muda o sentido) deveria pesar, por baixo (o por baixo aí é no bom sentido, trata-se, apenas, de uma força de expressão), uns 160 quilos.

Lembrando-me da senhora do caso anterior, empreendi com esse nosso atleta uma competição (tudo é válido para estimular a caminhada). “Com esse corpo (o dele) vai ser fácil deixá-lo pra trás”, conclui. Chegando mais perto, vi que ele, com uma dificuldade extrema, articulava uns movimentos que pareciam ser uns alongamentos. O nosso personagem vestia uma camisa do Fluminense, com o número 10 nas costas. Pensei logo: ”vou vencê-lo com tranqüilidade, pena que ele não seja vascaíno”. Como eu estava com a camisa do Flamengo, a vitória seria mais estimulante (vencer o Vasco em qualquer situação é bom). Claro que a competição só estava existindo na minha cabeça. E foi com um sorriso nos lábios, mais pro canto da boca, que comecei a perseguição. Alcançar o imenso “atleta”, que estava uns quinze metros à minha frente, era questão de minutos. Não! De segundos. Mas, para meu espanto, ele começou a dar passadas largas, incomuns para alguém, com todo aquele tamanho. Esse novo fato, levou-me a acreditar que a vitória não seria tão fácil como eu inicialmente imaginara. Pior! Não haveria vitória (pelo menos pra mim). Quanto mais acelerava o passo, mais (é muito mais mesmo) eu ia ficando pra trás, em relação àquele torcedor do Fluminense. O danado sumiu de vista, de longe, só dava pra ver o número 10 na camisa, que aos poucos, de tão pequeno, não se enxergava mais. Nunca, jamais, em tempo algum, havia presenciado um “obesão” (é que ainda estou com raiva dele) daqueles empreender tamanha rapidez (e disso entendo, já fui “obeso mórbido”). “Ainda bem que ele não é vascaíno”, pensei aliviado. Perder pro Fluminense vá lá. Mas pro Vasco? Vou eu, nesse pensamento, ruminando minha raiva contra aquela “casa da banha” (apelido que tentaram colocar em mim, antes da cirurgia bariátrica e quando mais jovem), já chegando ao Colégio Oficina, quando passam por mim duas senhoras. Uma aparentava uns 60 anos de idade e a outra, um pouco mais acabada (ainda bem que nem sei o nome delas), que achei ser mais idosa. As duas já iam adiante, uns dois ou três metros. A mais anciã volta-se para mim e dirige-me um aceno de cabeça, um olhar e pequeno sorriso. Fiquei buscando na memória de onde a conhecia, sem conseguir me lembrar. Fiquei intrigado com aquele cumprimento. “Ela me confundiu com alguém”, achei. De repente o mesmo conjunto de gestos, só que dessa vez o olhar foi mais insistente, com um que lascivo. Olhei pra trás para ver se aquele olhar sedutor seria pra outra pessoa. Ninguém. Era pra mim mesmo. “Não se enxerga, poderia ser minha mãe!” pensei desviando o meu olhar daquele olhar insistente, já acompanhado de um sorriso, também sedutor. Na realidade eu queria dizer é que ela poderia ser minha avó. O olhar de peixe morto continuava em minha direção. Fiquei tão incomodado que achei a ter visto aquela “bisa” (a essa altura já achava tratar-se de uma bisavó) morder o lábio inferior, quando me olhava. De repente, me veio certa alegria. Aquela pode ser uma senhora que gosta de jovens, ou seja, eu estava bem na tela. Enchi o peito, acelerei o passo, como se jovem fosse. Queria mesmo era me mandar dali, deixá-las bem pra trás, afinal eu estava sendo “classificado” de jovem. Mas logo, a alegria se transformou em apreensão. “E se essa senhora sempre gostou de pessoas mais velhas?” Perguntei a mim mesmo. Não quis nem saber da resposta. Preferi abraçar a primeira hipótese. Mesmo assim, tomei duas decisões. A primeira foi: volto daqui mesmo. E voltei. Não sem antes perceber o olhar de tristeza dela quando dei meia volta (aquele olhar que diz: vá não). Nada contra a velhice, mas… A outra decisão, não menos importante, foi: não ando mais pela manhã. Não ando meesmooooo! E não se discute mais sobre o assunto. Afinal, duas decepções numa caminhada só é demais pra mim.

 


5 Respostas para “Minha caminhada na Olívia Flores II”

  1. jdean

    Tem gente que pensa.O tempo” só passa para os outros!.O espelho é sempre o seu melhor amigo.

  2. Paulo Ludovico

    Sim amigo. Tenho 55 anos! para alguém de 65, tô fora! Faça bom proveito.

  3. jdean.

    A menos que eu não tenha compreendido a extensão da sua mensagem neste texto.Salvo engano,a senhora acenou sudando-o e voce não deu atenção.Já ouvi de “visitantes” ou quem sabe “turistas” passeando nesta mesma avenida, a seguinte frase;” O POVO DESTA CIDADE É MUITO FECHADO, NEM BOM DIA COSTUMAR DAR…”.Penso que isto, se deve, ao menos em parte a fama de cidade violenta!.Obrigando a muitos,ter sua maneira introspectiva.

  4. Flora

    Adorei essa!!!!
    Você sempre mandando bem Paulo Ludovico, parabéns!!!!

  5. Paulo ludovico

    Com esses textos (crônicas) não tenho e não quero ter qualquer pretensão literária ou passar mensagens de qualquer espécie que seja. Só tenho e só quero ter compromisso com a brincadeira. O velho e gostosíssimo jogar conversa fora. Zombando (no bom sentido)de mim mesmo (quando fui obeso mórbido) e de todos, principalmente de meus amigos (veja outros casos). Só quero conversa e assunto sérios na sala de aula, na frente de 70 alunos. Lá, a coisa é diferente. Agora, na situação descrita no causo, saudar com olhar lascivo e mordendo o lábio? Não tem “lero lero”. Tô fora! Aliás, “tô foríssimo”, ainda que mil anos tivesse.

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