Cuba, Yoani, liberdade e otras cosas

Por Ailton Fernandes

Existem duas vozes em Cuba. Ao menos, duas que ecoam para além da ilha caribenha. Uma é a oficial – de Fidel Castro, que hoje fala através do irmão Raúl e do Twitter (e às vezes, via veículos como o Gramma). A outra é a de Yoani Sánchez, a blogueira criadora do Generación Y, onde publica textos sobre a vida em Cuba, com duras críticas ao governo dos Castros. Por conta do antagonismo, um lado é visto como herói, enquanto ao outro lhe cabe o nome de bandido – vai depender de quem vê. Definir os lados, quem é o bem e quem é o mal, parece necessidade do noticiário e é uma leitura muito simplória de quem insiste em fazê-la, seja qual for a situação. É inegável que a realidade de Cuba é outra se comparada com os tempos antes de Fidel. Só para citar uma informação, a taxa de mortalidade infantil caiu de 50,5 a cada mil (1962) para 5,8 em 2011. Mas, o tempo de Fidel já se foi. Hoje, os cubanos querem direitos e oportunidades que nós brasileiros conquistamos, como ir e vir sem medo, falar e pensar sem medo, se unir e se manifestar sem medo, enfim, viver sem medo. E é isso que a Yoani coloca em seu blog através de crônicas onde mistura o amargo de viver em Cuba, com doses de humor e esperança. Se ela é ou não financiada pelos EUA não vem ao caso, a questão aqui é outra.

 O fato é que o Brasil não é Cuba. Após quase seis anos sendo impedida pelas autoridades locais por ser uma “contra-revolucionária”, ela só conseguiu sair agora do seu país por conta da reforma da lei migratória e veio primeiro ao Brasil, onde manifestantes a receberam com gritos de protesto. Yoani desembarcou em Recife, de onde seguiu para Salvador a fim de chegar a Feira de Santana, onde assistiria a exibição de um filme do qual é personagem. Assistir a um filme, esse era o compromisso dela. Ela não veio pedir proteção, nem para ser recebida por Dilma, muito menos buscar apoio para fuzilarem Fidel em praça pública.

Passaria despercebida (ou quase) no aeroporto se não tivesse manifestantes por lá. Alguns jornalistas a entrevistariam e as reportagens não ecoariam muito, tanto que a pauta sobre a visita mudou para a recepção com protestos. Daí ela seguiu aparecendo em todos os jornais nesta semana por conta dos protestos desenfreados e incabíveis por onde ela passava. A situação piorou quando a Veja publicou que um funcionário da secretaria geral da Presidência havia participado de uma reunião na Embaixada cubana, onde recebeu um dossiê sobre a blogueira – a presença do funcionário foi confirmada pelo Planalto, mas garantiu que o material recebido havia sido descartado.

Pronto, o cenário perfeito para os oportunistas aproveitarem. A mídia brasileira se esbaldou como urubu sobre a carniça e, de quebra, se aproximaram os partidos de oposição querendo uma lasquinha (tanto que recebeu convite de deputado do PSDB para ir à Brasília). Todos agora apóiam a blogueira, mas creio que poucos a conheciam e um número menor ainda conhecia seus textos e seu blog. Agora pergunte quem quer discutir sobre Cuba, quem quer debater liberdade de expressão e direitos humanos, quem está interessado em amadurecer o debate que a blogueira propõe. Ninguém! Esse era o objetivo inicial, agora a missão é saudar a ovelhinha perseguida por lobos nefastos – os campos foram definidos pelos oportunistas.

Ao lembrar que figuras como Lula e Dilma clamaram, em época não tão distante, por democracia, liberdade e por direitos, fico sem entender para que serviram essas conquistas. Para quando forem convenientes ao poder? Mas (peraê!!!), isso não é democracia! “Apoiando ou não uma causa, não transforme protesto em repressão. Muitos mártires enfrentaram a repressão pelo nosso direito de protestar” – li isso nas redes sociais e reproduzo.

Viver daqui do Brasil o ideal da revolução cubana, sem nunca ter pisado na ilha, é fácil demais, quero ver manter o seu idealismo e a proposta revolucionária nos dias de hoje. Quer saber, teria sido mais eficiente se a Embaixada cubana tivesse bancado meia dúzia de cubanos para vir ao Brasil manifestar a sua alegria de viver em Cuba e gritar aqui que a Yoani não os representa. Seria até um fato curioso, porque só se vê por aí cubanos que se dizem infelizes e fugindo do regime dos Castros… Ou é impressão minha?


2 Respostas para “Cuba, Yoani, liberdade e otras cosas”

  1. Marlene de Jesus Silva

    É isso aí Anderson,

    Repetindo a pergunta feita pelo Senador Suplicy: Do que Raul e Fidel têm medo? Se lá é tão bom assim, por que não abrir as portas para quem quiser sair e assim os próprios cubanosv propagariam para o mundo a tão maravilhosa vida em Cuba!

  2. Rebeca Reis

    A questão não é nem o medo Marlene. É querer o poder. Tanto tempo de liderança gera problemas que não consegue ser resolvido e o povo quer reivindicar – o que é normal, já que é um direito pelo menos em alguns lugares -, quem ta no poder não quer perdê-lo. Sair do país para mostrar ao mundo o que acontece em Cuba é jogar dinamite em Fidél e suas cobaias.

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