Ouvidos moucos

jeremias macário

Jeremias Macário

Há anos venho comentando que toda paciência, por mais que a pessoa seja cordeira, tem limites e um dia se esgota de tantos deboches. Não estava mais aqui disposto a falar dessa política nojenta e desavergonhada, que tem ouvidos moucos. Apesar de toda essa barulheira nas ruas, os poderosos (o executivo, o legislativo e o judiciário) continuam “surdos”, fazendo de conta que nada estão entendendo desse clamor desesperado do povo.

Mesmo sem lideranças programáticas e renegando as instituições políticas partidárias, que há anos falam de costas para a população, subestimando a nossa inteligência, o recado direto é pela moralidade e o fim dessa máfia que se tornou um monstro, deixando um rastro de destruição no país, bem pior que os quebra-quebras dos “vândalos”, “baderneiros” e “arruaceiros”, assim chamados pela nossa mídia manipuladora que maquia a verdade.

Todos sabem que a farsa do plebiscito é somente para tirar o foco das manifestações que pedem melhorias na saúde (fim dos hospitais matadouros e corredores das mortes), na educação ( professor faz de conta que ensina e o aluno que aprende), na segurança e nos transportes públicos. Vem agora o PT e se diz a favor das mudanças. Que mudanças? Se tivessem seriedade e respeito, retirariam das emissoras de televisão os horários eleitorais irritantes das propagandas mentirosas.

O recado é que os deputados e senadores cortem suas mordomias (são os políticos mais caros do mundo); reduzam as cadeiras no Congresso, nos legislativos e nas câmaras municipais; e parem de legislar em proveito próprio. Além dos altos salários (verbas de gabinete e outros penduricalhos), aumentaram o número de vereadores, tentando nos enganar de que isso representaria serviço de qualidade para os municípios. Basta de nos fazer de bestas, otários e idiotas!

No lugar de falar dessas ações concretas, numa reforma geral do Estado Elefante, que tem 39 ministérios e mais de 20 mil comissionados, a maioria de medíocres, para engordar a máfia das coligações partidárias, o executivo aparece com a feitiçaria marqueteira de um plebiscito do outro mundo, passando a responsabilidade para o legislativo. Essas leis e projetos nada mais são que cala-bocas. Já estamos cheios de propaganda enganosa. Tudo não passa de uma manobra diversionista de uma “esquerda” que agora fala em poder de mudanças.

Diz o ditado que “a esperteza quando é grande vira bicho e come o dono”. O pior é que esses políticos como o Renan Calheiros e o Henrique Alves presidentes do Senado e da Câmara, respectivamente, com os cinismos próprios deles, riem à toa e fazem de ouvidos moucos, pousando de bons mocinhos em apoio às manifestações.

Outro ditado é que “o uso do cachimbo é que faz a boca torta”. Pois é, continuam atolados na degradação moral, como o costumeiro uso da coisa pública (caso recente dos aviões da FAB) para passear com amigos e familiares. O presidente da Câmara inventou um compromisso oficial com o prefeito do Rio de Janeiro e encheu o avião do Estado com parentes para assistir o jogo da seleção.

Até quando eles vão continuar sem escutar a voz que vem das ruas pedindo por respeito e dignidade? Até quando vão continuar abusando da nossa paciência, como fazia Catilina na antiga Roma? Não é apenas aprovando projetos de crime hediondo para quem comete corrupção e ficha limpa para cargos públicos que o problema será resolvido. De que adianta essa fachada moralizante, se o judiciário é lento e sempre tarda? Se as leis abrem várias brechas para a impunidade?

Existe uma lista interminável de usurpações do poder, os quais os políticos e os ditos representantes do povo sabem de cor, mas fazem de conta que nada entendem. Aqui mesmo, em Vitória da Conquista, o hospital regional é um corredor da morte. O São Vicente (Casa da Misericórdia) se transformou em duas alas, uma dos ricos e outra dos pobres miseráveis, sem atendimento médico. Nosso meio de transporte é péssimo, e o trânsito é cada vez mais caótico, entupido de carros emporcalhando as ruas.

UMA CARTA ABERTA

É fato que de tanto abusarem, as instituições não merecem mais o crédito do povo, muito menos os partidos, mas tem que haver uma liderança forte, organizada e confiável que faça uma carta aberta dos brasileiros aos governantes, bem esclarecedora e direta, para que não continuem com o pretexto de que não estão entendendo os protestos das ruas. No início, a presidente disse que a manifestação não passava de um grupo isolado.

Não estou aqui pregando a violência, mas, quem mais tem praticado violência neste país nos últimos anos? Outras ondas virão ainda mais fortes. Existem os “vândalos”, mas lá estão também os mais indignados dos indignados. Existem também os infiltrados que têm interesse em desvirtuar os movimentos. Existem os de extrema-direita reacionária e retrógrada dos partidos evangélicos que até pensam numa ditadura, que um dia foi apoiada pela marcha da família, pátria e liberdade e pela sociedade civil, inclusive a Igreja Católica.

Com nomes diferentes, este governo, que tanto condenou, está privatizando as nossas rodovias, portos, aeroportos e outros bens públicos, aplicando a duplicidade de impostos, como é o caso dos pedágios (já pagamos um caro IPVA). Esses governantes gastaram quase 30 bilhões de reais em novos coliseus futebolísticos, que mais parecem cogumelos brotando da terra de um país que não deveria sediar uma Copa do Mundo, sem antes zelar da sua casa, cujos moradores estão insatisfeitos.

São esses governantes que emprestam quatro bilhões de reais ao empresário Eike Batista, amigo do governador do Rio de Janeiro, para ele sair da falência. Sem mais delongas, tem muito mais sujeira jogada debaixo deste imenso tapete. Cabe a nós pressionar para que eles façam a varrição e incinerem esse monte de lixo, inclusive radioativo e tóxico.


3 Respostas para “Ouvidos moucos”

  1. Edileusa de Andrade

    Meu caro Jeremias Macário. Com essas palavras você disse tudo que eu acredito e estava travado na garganta!! Parabéns!!

  2. Carlos Alberto Correia

    Parabéns Jeremias – pode ter certeza que nós povo, pensamos como você e estamos entendendo a intenção deles de desviarem o nosso foco com esse plebicito sem sentido. Eles sabem que queremos moral, educação, segurança e principalmente saúde, o resto é conversa pra boi dormir.

  3. josé mário ferraz

    Grandes verdades. Pena haver tão poucas pessoas esclarecidas em meio à multidão de bailarinos de axé e futebola. Nada saído da corja que domina o poder nesse país desde sempre merece alguma esperança. Com a educação comandada por um bigodudo que só cuida de politicagem, não se pode esperar coisa boa desde quando a educação é a única via para uma sociedade agradável. Tudo o que os politiqueiros querem é enrolar os jovens e parece que vão conseguir. Perguntei a um estudante do curso de farmácia quais os comentários entre seus colegas sobre o movimento das ruas e a resposta me deixou triste: NENHUM! Se a juventude esmorecer e abandonar a luta, continuarão os desmandos. Atitudes inteligentes como a demonstrada no artigo e no comentário do Carlos Alberto Correia por parte de todos os jovens é a única esperança de fazer um país que tenha vergonha na cara. O Estado faliu. O barulho referido na matéria me levou a requerer em 15 de março à Promotoria Pública que obrigasse a prefeitura a coibir tal abuso face aos transtornos que causa à saúde, entre eles o nervosismo e impotência sexual, segundo declaração dos cientistas da ONU. Houve reunião com a presença do promotor, o secretário municipal de meio ambiente, e algumas pessoas interessadas. De lá para cá, o barulho só fez aumentar. Os carros do G. Barbosa e do Santo Antônio disputam qual o que grita mais alto. A única esperança é uma juventude ligada em outras coisas que não as banalidades de sempre.

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