Entre Fezes e Urina

Jorge Maia

Jorge Maia

Nunca assisti a um parto. O único do qual participei foi o meu, mas não me lembro de nada, se não daquilo que contam para mim. Sei que alguns pais, em rasgo de heroísmo, resolvem assistir ao parto de filho que vai chegar e terminam desmaiando, dando um trabalho extra para a equipe que cuida mãe e do nenê que está nascendo.

Nunca tive natureza para enfrentar esse tipo de cena, e, certamente, não resistiria sem desmaiar, mas nem por isso ignoro a grandeza das forças da natureza, emergindo em vida nova, em sua forma criadora, trazendo ao mundo uma criaturinha que representa esperança.

O parto apresenta-se como um misto de beleza e choque. Beleza pela vida que eclode para encanto da mãe e da equipe médica, testemunhas embevecidas dos primeiros momentos da vida nova. Pode ser um momento histórico para alguns, ou pode ser apenas um momento repetitivo da atividade cotidiana, mas sem nunca perder o encanto da vida, mesmo que seja “uma vida Severina”.

Assim é o lado romântico e gratificante do parto. Há outro lado, e nem todos suportam aquela visão. Um misto de dor e uma visão desagradável de substâncias viscosas, nada encantadoras. A estética é assustadora. A beleza fica por conta da esperança da renovação da humanidade e da melhoria do mundo, sentimento que abrigamos em nossos corações.

Nascimento e morte nos igualam. Se há diferenças do tipo de leitos, não modificam quanto ao resultado. Nascemos pelo mesmo lugar e na afirmação de Santo Agostinho: entre fezes e urina nascemos, ditando a igualdade entre os seres humanos, o que muitas vezes é ignorado por muita gente que não sabe em que meios a natureza o trouxe à vida.

Não conheço ninguém que busque a proteção de Santo Agostinho, talvez porque santo intelectual não faça milagre, preocupado com outros ensinamentos. Não sei de ninguém que em desespero diga: valei-me meu Santo Agostinho. Eu diria se tivesse de assistir a um parto.
Milagres à parte, não podemos ignorar a lição do Santo a qual nos reduzem, de modo acertado, a uma igualdade santificada pelo milagre da vida. A mesma vida que levada pela cultura da desigualdade cria barreiras e desigualando os seres humanos e de forma impiedosa discrimina em razão das diferenças sociais, ou pelas diferenças estéticas criadas pela natureza, para quem todos são iguais.

No dia 30 de fevereiro assisti a uma audiência na Vara Cível da Comarca da Beócia, o juiz era Dr. Macambúzio, homem conhecedor da Ciência do Direito, mas arrogante, mal responde a um bom dia. Ameaça prender testemunhas por qualquer insignificância, deselegante com os advogados. Sua escrivã, a quem os leigos chamam de dona escrivona, dona Pomponet do Canto Triste, é de uma grosseria e arrogância que assusta aos advogados iniciantes, maltratando partes e aos demais serventuários daquela Comarca.

Saí da audiência, despedi-me de ambos, os quais sequer responderam, meditando sobre aqueles que assumem cargos, passam em concursos, mas não se especializam em gente, causando a impressão que suas almas continuam no meio das substancias em que nasceram. Que pena! Na parede, um cartaz fala sobre receber o público com um sorriso. Vit. Conquista, 05.08.13


5 Respostas para “Entre Fezes e Urina”

  1. DAYANNE

    SAUDADES QUERIDO PROFESSOR. E COMO SEMPRE UM TEXTO FANTÁSTICO.

  2. Luam

    Muito bom professor Jorge Maia!

  3. YLDENE

    MEU GRANDE MESTRE EXCELENTE TEXTO!UM GRANDE ABRAÇO NO CORAÇÃO!SAUDADES

  4. Victor Lopes

    Ainda que não seja o Santo guerreiro e tão pouco o Amado, não furto em dizer: Salve Jorge!

  5. Anamaria Maia

    Simplesmente inefável!!!

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