Não se fala mais no menino

Jeremias Macário

Jeremas Macário

O caso do menino Maicon que foi vítima de uma bala perdida numa ação desastrada da polícia militar, num bairro da periferia de Vitória da Conquista, logo mais estará completando um ano, sem o devido esclarecimento. Os pais não tiveram nem o direito de enterrar seu filho, dignamente.

No Dia dos Pais, no último domingo, Maicon não estava lá para comemorar a data. O tempo foi passando e ninguém tocou mais no assunto, principalmente a mídia, no sentido de cobrar uma satisfação. A sociedade calou-se, assinando embaixo mais um ato de injustiça e atestado de que a lei não é mesmo igual para todos.

No início do desaparecimento do menino, se não me engano em dezembro passado, um representante do Ministério Público Estadual esteve em Conquista, mas nem assim o processo teve a agilidade que merecia.

O exame de DNA do sangue encontrado no chão onde o menino estava, para constatar se era compatível com o do pai, demorou cinco meses para ser feito. Depois do resultado positivo e do possível indiciamento dos militares que estiveram no local e chegaram atirando para separar uma briga de adolescentes, nada mais se divulgou.

Como escreveu Hannah Arendt sobre os massacres alemães na Segunda Guerra Mundial, nossa sociedade se habituou mesmo com a “banalidade do mal”, e os pobres são as maiores vítimas das matanças. Sabe-se que os pais de Maicon foram ameaçados para que não falassem.

Maicon

Como o mal virou banalidade, creio que os culpados não sentem remorso e dormem com a consciência tranquila, como fazem muitos políticos e governantes quando roubam o dinheiro dos cofres públicos. Afinal, o que é ético para uma pessoa pode não ser para outra, como disse o senador Edison Lobão Filho.

Mas, voltando ao caso do menino, os pais ficaram sozinhos, rogando e mendigando por uma resposta das “autoridades”. Cadê os segmentos ditos organizados da sociedade, que só se levantam quando é coisa do interesse deles? Cadê o Movimento Contra a Morte Prematura, de André Cairo, e de outros que brigam pelo aeroporto, pontes, direitos iguais para as minorias, cotas e água para a cidade? A morte violenta e prematura de um menino pobre não importa muito. Só nos comprometemos com aquilo que não nos ameaça, incomoda ou o que é do interesse próprio.

É essa a democracia envergonhada que vamos deixar para nossas gerações?  Por sua vez, a mídia deixa muito a desejar no que tange ao seu papel de cobrar, pressionar, investigar e mostrar os fatos. Não houve manifestações para que o caso do menino Maicon fosse esclarecido, com a punição dos culpados. Não dá para acreditar em fatalidade e ficar por isso mesmo. Todos nós somos culpados, mas fazemos de conta que não.

Por falar em manifestações e protestos, o gigante Brasil voltou a dormir em berço esplêndido. O Congresso Nacional fez umas gracinhas e continuou falando de costas. Os aviões da FAB vão continuar rasgando os céus nos passeios de curtição dos eleitos e nomeados. As mordomias vão ficar nos mesmos lugares de sempre, com as polpudas indenizações. Os ministérios podem aumentar e mais cadeiras parlamentares devem surgir.

Na certa, devem ter concluído há muito tempo que o gigante é desengonçado, comodista e sem liderança. Não mete medo, mas cuidado que um dia ele pode perder a paciência e degolar as cabeças malvadas. Nem as pesquisas de opinião, condenando suas atitudes abalam os malfeitores. Perdura a “banalidade do mal”, sem limites.

Agora, os lados “opostos” (são os mesmos) se digladiam para ver quem vence o campeonato da corrupção. Uma banda, ou bando, diz que o outro roubou mais e cada um aponta o dedo em riste, ora aliviados por ganhar mais tempo para prosseguir com as safadezas futuras, ora calculando e maquinando como dar o bote para nocautear o “adversário”.

Tudo continua como dantes na casa de Abrantes. Só mudam os rótulos. Subdesenvolvimento vira emergente, corrupção e formação de quadrilha vira cartel, transporte público passa a ser denominado de mobilidade urbana, operários explorados são aliciados como colaboradores, negro é chamado de afrodescendente, ladroagem é só desvio de recursos, velho e idoso é terceira idade, indignação vira vandalismo.

Enquanto isso, as raposas permanecem tomando conta dos mesmos galinheiros das enganosas e mentirosas CPIs. Os mensalões e as investigações mais parecem estórias do fim do mundo. A impunidade é a suprema lei de todas as leis e ainda nos iludimos de que somos todos iguais.


Uma Resposta para “Não se fala mais no menino”

  1. QUEM?

    Neste país os lobões, tem sempre razão,caro jornalista!

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