All that calça Lee

Jorge Maia

Jorge Maia

A expressão é sonora e a copiei do título de um filme: ” All That Jazz”, linda película, cujo título nos remete a uma recordação, não a uma ” amacord” italiana, mas a sensação de saudade de um tempo que foi representativo em nossa existência ou de um  momento especial, é que eu me lembrei da minha calça Lee.

Quem encontrar alguém usando uma calça Lee, por uma rua qualquer, não pode imaginar sobre o eu quero dizer aqui. Estou falando daquela calça Lee produzida até a década de setenta do século vinte. Sua cor azul índigo blue, o cheiro do tecido, a textura, tudo isso era muito próprio daquela roupa.

Não foi fácil comprar uma calça Lee. Só aqueles que iam a Miami e traziam para vender aqui por um preço absurdo, era o muambeiro, que ganhava dinheiro com a venda do objeto do nosso desejo. Depois, podia ser comprada na zona franca de Manaus tínhamos os nossos muambeiros que ganhavam a vida trazendo equipamentos e em especial calça Lee.

Alguns preferiam lavá-la antes da estréia, pois causava impacto aquele jeito de que fora pré-lavada, às vezes espancada em pedras, ainda molhada e com sabão, causando marcas. Enfim era chic. Na primeira lavada soltava tanta tinta que seria suficiente para pintar uma pequena casa. Era um exagero.

A calça Lee, juntamente com certo refrigerante eram o símbolo do imperialismo. Sei de um caso de alguém antiamericanista que surpreendeu  uma de suas irmãs usando uma dessas calças e surrou a pobre e indefesa moça, a qual não sabia o que era imperialismo e nem nacionalismo, muito tempo depois é que  soube porque apanhou. Aquela calça não influenciou as minhas concepções politicas ou ideológicas.

Enfim, a Universidade! Como poderia morar em Salvador e não ter ma calça Lee? Procurei mostrar ao meu que seria um bom investimento, pois era uma calça que permitia  ser usada por semanas, sem precisar lavar, trocando apenas a camisa, pois todos usavam Lee e ninguém perceberia que era a mesma peça de roupa. Convenci e comprei de um muambeiro a minha calça Lee.

CEUSC – casa do estudante-, aulas, provas, campus espalhado por toda a cidade, cada unidade mais longe que a outra. Quem teria tempo para lavar roupa, ou pior, pagar para lavar roupa toda semana. Foi aí que nasceu uma lenda sobre a minha calça Lee: os colegas diziam que ela nunca fora lavada, mas eu, do alto do meu espírito defensivo galhardamente dizia que ela era lavada em junho e janeiro, nas férias em Conquista. Sim era verdade.

 Um belo dia, portas e janelas abertas, às seis da manhã, todos ainda dormindo, fomos surpreendidos com gritos: estudantes, olha o ladrão! Vocês estão sendo roubados. Foi um desespero. Como poderia alguém roubar aqueles jovens brincalhões e pobres? Quase enlouqueço quando dei por falta da minha calça Lee, em cujo bolso se encontrava o dinheiro para o ônibus. Gelei.

 Foram tantos os gritos que os ladrões largaram tudo, inclusive a minha calça Lee e com o dinheiro no bolso. Que alívio! Alguns colegas juram que viram a minha calça voltar caminhando. Não foi bem assim, prefiro não contar como ela retornou, mas corre esta lenda urbana, até hoje cercada de mistérios, sobre os quais evito falar. VC310114.


Os comentários estão fechados.