Jeremias Macário
Não é verdade dizer que o rojão aceso por dois rapazes em manifestações no Rio de Janeiro foi um atentado direto à imprensa, nem que os acusados tinham como alvo o cinegrafista. No entanto, foi essa manipulação da notícia que ouvimos no início dos acontecimentos de uma grande emissora de televisão.
Não estou questionando aqui o ato inconsequente e violento que foi o de acender um rojão numa praça pública com centenas de pessoas no local. Infelizmente, o cinegrafista foi vítima de uma irracionalidade e brutalidade humana. Distorcer os fatos puramente por condenar a ação dos Black Blocks é gerar mais violência e ódio.
Sabemos que esses grupos taxados de vândalos têm hostilizado emissoras, inclusive com depredações e incêndios contra seus veículos, mas isso não permite apontar o dedo pra eles e logo de saída dar suas sentenças. O jornalismo, nestes momentos, tem que ser sereno e racional com a notícia, sem rancor. Não dizemos sempre que violência gera violência?
Será que dar para entender que o cinegrafista era o alvo dos acusados que acenderam o rajão, e que eles tinham a intenção precípua de atentar contra a liberdade de expressão? Quem são mesmo os verdadeiros culpados por tudo isso que está acontecendo em nosso país? Por que temos que engolir tudo que recebemos de informações e notas sem antes pensar e refletir?
A grande mídia, especialmente as emissoras de televisão, investe pesado em programas apelativos e violentos visando a audiência e o lucro, mas, ironicamente, entra em contradição quando em seus noticiários diz falar a verdade e pede paz.
Ouve-se sempre dizer por aí que os veículos de comunicação são formadores de opinião, só que a grande maioria deforma a informação para se beneficiar do seu interesse particular. Engraçado quando o governo atual acusa a mídia de elitista e não enxerga que ela está sempre a serviço do poder que a sustenta.
Os canais de televisões e rádios que são concessões públicas deveriam se preocupar em oferecer cultura de qualidade e não induzir o povo à burrice e à alienação. Em busca incessante pela audiência e pelo lucro, seus diretores simplesmente alegam que são esses programas que os telespectadores e os ouvintes gostam. Nos dão lixo e porcaria porque são dessas coisas que gostamos. Sabem que podem distorcer e manipular porque a grande maioria não é letrada, politizada e não tem senso crítico.
Já se perguntou por que a grande mídia tem horror quando se fala em criação do Conselho Nacional de Comunicação? Com seu poder de penetração e lavagem cerebral atira contra a ideia para todos os lados propagando que Conselho é censura e volta à ditadura.
Fazer o quê nesse nosso país sem cultura, se os donos dos veículos têm o poder de coação e persuasão? Muitos países desenvolvidos, como a Inglaterra, têm suas normas de regulação, conduzidas e exercidas pela própria imprensa, e nem por isso acabaram com a democracia.
Longe de mim fazer apologia à violência, mas é muito difícil falar em paz num país onde é o 77º no ranking da corrupção no mundo entre 180 pesquisados por um organismo da ONU; onde a lei não é igual para todos e a educação é uma vergonha nacional.
É muito difícil se falar em paz onde famílias choram nos corredores dos hospitais vendo um ente querido seu morrer por falta de atendimento médico. É muito difícil se falar em paz quando o marido é obrigado a fazer o parto da sua mulher porque a ambulância se recusou a dar socorro.
É muito angustiante, pelo menos para quem é humano, ver uma senhora de 80 anos derramando seu resto de lágrimas e rogando a Deus por água e um tratamento de saúde porque o prefeito da cidade desvia os recursos públicos para ele e seus aliados.
Existem os excessos sim, mas do jeito que o povo brasileiro tem sido abusado e maltratado contra seus legítimos direitos, podemos dizer que esse povo não é violento, mas cordato, conformado e difícil de indignar-se. Somos sim, vítimas da outra violência das ruas em razão de um conjunto de fatores e porque o governo se nega a investir na segurança pública.
A mídia anuncia que o governo está antecipando mais de 70 milhões para terminar o estádio do Atlético, em Curitiba, no Paraná, quando deveria explicar que é dinheiro tirado do povo. Para que maior abuso do que esses gastos astronômicos para sediar uma Copa do Mundo?