Jorge Maia
Eu era menino, e não faz muito tempo, quando meu pai levou-me até a sua roça, onde tinha um pequeno curral. Era em Aracatu, área de caatinga. A seca imperava e o sofrimento era grande. Cuidar do pequeno rebanho era ato de heroísmo, pois manter os animais era gastar tudo que tinha, como se estivesse comprando-os outra vez, tal era despesa para a sua manutenção.
Era um final de tarde e o eu o acompanhei a maior parte do tempo levado em seu colo, como se dia dizia antigamente: na cacunda, pois sendo magrinho não suportava a caminhada, embora não fosse tão distante da cidade. Para mim era um passeio. Ver a caatinga com seus arbustos retorcidos pela seca e sentir a tristeza da natureza, que, corajosa, insistia em viver desafiando o que todos chamam de destino.
Era final da tarde. Não tão tarde, pois era preciso retornar com o sol ainda no céu, permitindo encontrar o caminho de volta com mais facilidade. Meu pai deixou-me na porteira e pediu-me para esperar. Certamente não queria que eu me espinhasse ou cortasse a perna descoberta pela minha calça curta. Pediu-me para esperar, alertando que não saísse dali. O que prometi com segurança.
Meu pai embrenhou-se no mato em busca de uma rês que precisava voltar para o curral. A espera pareceu-me longa, mas tudo ia bem, até que ouvi um canto, para mim assustador. Naquela tarde silenciosa, aquele canto pareceu-me terrível, senti-me desolado e sai estrada a fora, sem direção. O medo tomou conta de minha alma de menino. Aterrorizado segui adiante, sem saber para onde ia. Hoje eu diria que eu estava Lost.
Cheguei a uma casa em que a moradora “Sá Bazila”, assim conhecida, suponho que era na verdade “Sinhá Bazília”. Era uma negra alta, magra e de cabelos brancos, dessas que todos nós chamaríamos de vovó. Conheceu-me e levou-se ao seu colo, abraçando-me afetuosamente, perguntando-me o que eu fazia ali sozinho. Respondi que eu fugi com medo da sariema.
Pouco tempo depois meu pai apareceu e levou-me para casa. A minha história correu por toda a cidade e foi comentário na pequena Aracatu. Era um fato assim que quebrava a monotonia da cidade, mas que integrava as pessoas nas suas conversas.
Hoje, as pequenas cidades são notícias pelos assaltos aos seus bancos, prisões de prefeitos, drogas do que todos temos medo. Em todos os lugares o medo gela a nossa alma, não pelo canto da sariema, mas por todas as razões que acima apontamos, sem contar o medo que todos temos do goolge, da internet, dos drones e dos políticos e não somos mais meninos, não temos uma “Sá Bazila” para nos acalmar. VC19.04.14