Opinião: Autonomia econômica e igualdade no mundo do trabalho

Elane Ferraz dos Santos

  Elane Ferraz dos Santos

O 1º de Maio nos faz refletir, mais uma vez, o quão é desigual o mundo em que vivemos e como ainda somos – nós mulheres – discriminadas também nas relações de trabalho no que se referem a salário, carga horária, ocupação de cargos, condições de trabalho, tratamento, etc.

Nas últimas décadas, a presença das mulheres nas mais diversas áreas de trabalho e profissões tem aumentado significativamente, mas ainda é proporcionalmente menor que a dos homens. Sete em cada dez homens na população economicamente ativa trabalham ou procuram emprego, enquanto menos de cinco em cada 10 mulheres estão na mesma situação e a diferença salarial, mesmo no século XXI, ainda é gritante! As mulheres recebem somente 73,8% dos rendimentos dos homens, ou até menos se considerarmos as desigualdades raciais; a renda média das mulheres negras equivale a um terço da dos homens brancos!

Ainda que tenhamos ampliado a nossa presença no mercado de trabalho, ganhamos menos que os homens quando exercemos as mesmas tarefas, apesar das mulheres terem conquistado uma maior escolaridade em relação aos homens. A autonomia econômica das mulheres, base indispensável para nosso efetivo empoderamento, passa pelo desenvolvimento de políticas públicas voltadas para a inserção e a permanência das mulheres no mundo do trabalho, a ampliação dos seus direitos trabalhistas e sociais e por mais igualdade entre mulheres e homens, tanto na cidade como no campo.

Outra questão a ser refletida neste 1º de maio é o trabalho “invisível” da mulher, pois o trabalho doméstico e as tarefas familiares são ainda considerados espaços prioritários e exclusivos das mulheres, recaindo sobre nós as responsabilidades domésticas de limpeza, alimentação, o cuidado com as crianças, doentes, idosos! Toda essa carga de trabalho é considerada nas estatísticas como “inativas”, deixando de detectar e registrar esse trabalho economicamente “improdutivo”, que consiste numa lista extensa de atividades domésticas não remuneradas. Falta ainda o reconhecimento, por parte da sociedade e do Estado de toda a nossa carga de trabalho e dedicação à manutenção e reprodução da família e do gênero humano. Deve-se compreender a dinâmica do uso do tempo pelas mulheres para subsidiar a formulação de políticas públicas voltadas para o atendimento de crianças, idosos e afazeres domésticos. Para isso, é necessária a ampliação de creches em tempo integral, tanto na zona urbana como rural; o acesso a bens e equipamentos que possam ajudar a reduzir o tempo e o desgaste do trabalho doméstico; o incentivo à participação masculina na responsabilidade com as tarefas domésticas.

Muito temos ainda pra avançar na legislação e alterar as relações de trabalho entre mulheres e homens. A dupla jornada de trabalho das mulheres é uma das principais responsáveis pelas condições desiguais entre mulheres e homens no mundo do trabalho. Em 2010 as mulheres informaram ao IBGE que gastam cerca de 24 horas semanais em atividades domésticas não remuneradas, ao mesmo tempo que os homens declararam a dedicação de apenas 10 horas semanais a tarefas domésticas e familiares, reforçando a divisão sexual do trabalho.

Mais uma questão que nos faz refletir é sobre o trabalho doméstico, aquele que é (mal) remunerado. No ano passado vivenciamos, na discussão da aprovação da Proposta de Emenda Constitucional – PEC 478/10, que estende a todos os empregados domésticos  direitos já assegurados a outros trabalhadores, como: jornada de trabalho de 44 horas semanais; recolhimento do FGTS, seguro-desemprego, hora-extra, adicional por trabalho noturno, salário família e auxílio-creche, as mais diversas opiniões, dessa profissão que é essencialmente feminina. Esse tema ganhou visibilidade, algo positivo, no entanto, segundo o Pnad/IBGE 2011, do total de trabalhadores domésticos (6,7 milhões) somente 32% tinha carteira assinada. Muitas domésticas ainda se encontram em regime semiescravo, não recebendo nem se quer o salário mínimo. É uma profissão marcada por uma jornada de trabalho sem controle e sem respeito ao descanso do grande contingente que, ainda por cima, na maioria dos casos, dorme na casa em que trabalha.  Essa questão nos coloca a pensar que se trata de uma luta de classe e que devemos estar nessa luta para acabar com mais uma injustiça secular que ainda temos em nossa sociedade.

A autonomia econômica das mulheres e a igualdade no mundo do trabalho são condições indispensáveis para que as mulheres possam prover o seu próprio sustento, decidindo por elas mesmas a melhor forma de fazê-lo. Haveremos de ter ainda um mundo justo, capaz de reconhecer, nas diferenças divinas de homens e mulheres, a igualdade humana de direitos e a semelhança de ações fraternas.


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