Jorge Maia
Meu foi tropeiro dos dezessete aos vinte anos. Por três anos seguidos viajou conduzindo tropas pelo sertão da Bahia. Seu roteiro era longo e passava pelas dificuldades e privações que o caminho determinava.
Partindo de Aracatu, seguia para Contendas levando mamona e algodão. A viagem era longa, o sol inclemente e iniciava a sua jornada logo cedo. A tropa descansava a partir das quatro da tarde, sempre em local que havia pastagem e ali permaneceria até três da manhã, quando os homens já tinha avançado em prato de feijoada feita com muito toucinho. Afinal, o trabalho era árduo e exigia sustança para aguentar aquele rojão.
Ás seis da tarde todos se preparavam para dormir. Estendiam um couro de boi, junto a uma pedra ou outro encosto, e com outro couro se cobria. Havia a beleza das estrelas em céu de noites claras, eram tantas que pareciam despencar céu abaixo. Eram as noites belas que enfeitavam a vida e o sono daqueles homens cansados, distantes de suas casas e famílias.
Haviam as noites chuvosas em que debaixo do couro temiam-se de frio, com o leito invadido pela água. Mas vida continuava no dia seguinte e nada que um bom prato de feijão com toucinho não curava, até mesmo da tristeza de uma noite sofrida.
De Contendas para Ituaçu onde carregava a tropa com cal e levava para Jequié. Era outra viagem demorada e levava mais de dez dias para ali chegar, temendo chuva que poderia molhar a cal e seria prejuízo na certa. A aventura maior era outra, era a longa viagem de Jequié para Pedra Azul.
Sim, havia frete de Jequié para Pedra Azul/MG. A tropa pegava a mercadoria que o trem trazia até Jequié, tecido por exemplo, e viajava por quinze dias até o destino final. Em todo o trajeto as dificuldades eram as mesmas: muito sol, às vezes chuva, dormir em couro de boi e seguir com a mula, ou às vezes caminhar das quatro da manhã até às quatro da tarde.
Foi em daquelas viagens que conheceu a minha mãe em ” Tucum” que hoje pertence a Tanhaçu. Casaram-se e conviveram com ela por sessenta e quatro anos. Até abril deste ano. Certamente aquele encontro em “Tucum” foi o melhor da sua vida. Em julho completará noventa e um anos, mas ainda fala daquela viagem e daquele encontro. VC070614