Jeremias Macário
Em todas as eleições o que mais se houve da mídia, dos juízes e dos eleitores são as palavras “dever cívico”, “cidadania”, “exercício da cidadania” e por aí vai, que correm soltas como se apenas o ato de votar já complementa tudo como dever do cidadão. Pode até ser um dever cívico se a expressão de escolher o candidato for consciente, sem manipulação e compra do voto, direta e indiretamente. Quem se vende e é manipulado não está fazendo o “dever cívico”.
Bem, mas não é isso que proponha falar. Embora não seja especialista político, ou cientista-político como dizem por aí, os resultados das últimas eleições veem demonstrando um avanço acentuado dos evangélicos que, na grande maioria, adotam uma linha conservadora e muitos deles até de extrema-direita com o velho discurso de tradição, família e pátria, elogios às forças armadas e até apoio à ditadura militar.
Os homofóbicos declarados, contra a descriminalização das drogas e do aborto, Jair Bolsonaro, o filho dele, Marco Feliciano, sargento Isidoro, na Bahia, e muitos outros do mesmo naipe, sem falar no pastor Marcelo Crivella, candidato a governador no Rio de Janeiro, foram o mais votados no Brasil. Os partidos alinhados às correntes evangélicas tiveram votação estrondosa. Que tudo isso sirva de reflexão para que a história não repita.
Várias correntes cortam este mar eleitoral de 32 partidos onde a indiferença à política também cresce de tamanho, em detrimento dos escândalos de corrupção, malfeitos e promessas não cumpridas.
Outro dado é que quase 50% dos jovens entre 16 e 18 anos deixaram de votar, sem contar as abstenções que somente na Bahia foram superiores a 20%. Cerca de 2,5 milhões não foram às urnas no estado (no Brasil, 27,6 milhões). Nulos, brancos e abstenções no país superam os 38 milhões, bem acima dos votos dados a Marina Silva (22 milhões).
Do outro lado, avança o dogmatismo, ou seja, o voto fiel de matriz religiosa que, como já disse, é conservadora às mudanças sociais. Temos ainda a votação de interesses de determinadas categorias, inclusive de torcedores de times como a eleição do ex-presidente do Corinthians, Andrés Sanchez, de São Paulo, com mais de 170 mil votos.
Para não ir muito longe em minha análise, outra cara do Brasil que vem se desenhando é a divisão entre ricos do Sul, Sudeste e Centro Oeste, e pobres do Nordeste e Norte, com exceção de Pernambuco que sofreu a influência da morte do ex-governador, Eduardo Campos, o que demonstra também que o eleitor brasileiro continua emotivo e sentimental, tanto que Marina subiu nas pesquisa logo após o acidente de avião, em agosto, que vitimou o candidato do PSB.
A maior parcela desse eleitorado do PT de Dilma vem do Bolsa Família, sem bem que estão inclusos aí também outros benefícios concedidos pelas políticas públicas. Por ser de uma camada simples da população, de pouca instrução, essas pessoas consideram essa ajuda como favor e não obrigação dos governos. A maior parte desse contingente, por motivos óbvios, é de linha conservadora, manipulável pelas doutrinas religiosas.
Contradizendo tudo isso, numa ponta da corda aparece crescendo uma linha mais de esquerda que vem resgatando o discurso do PT quando foi fundado nos anos 80. Trata-se do PSOL que, proporcionalmente, foi o partido que mais teve votos nestas eleições, se bem que elegeu poucos candidatos. Em vários estados, para governador, o PSOL ficou em terceiro e quarto lugares como ocorreu com Luciana Genro, candidata a presidente.
No mais, destaque negativo para os graves erros das pesquisas de opinião, como na Bahia, principalmente, no Rio Grande do Sul e no Rio de Janeiro entre Marcelo Crivella e Garotinho, só para citar estes resultados. Um ponto positivo é que o eleitor não está mais acreditando nas mesmices das pesquisas e do marketing político como antes.