Jorge Maia
Fui convidado para assistir a uma palestra no auditório da UEBE – Universidade do Estado da Beócia. Embora estivesse muito ocupado, não pude resistir. O convite partiu do filósofo Zé Picuinha, de quem já falamos em outra ocasião. O tema da palestra era: E o Direito, o que é? Não esconde um leve sorriso, afinal, o tema é interessante, torna-se especial em razão do palestrante. Confirmei a minha presença, mas antes cobrei a promessa de que eu teria suco de gabiraba e fofão, importados de Aracatu. Fui atendido.
O voo não atrasou, mas tive problema com meu passaporte, mas tudo resolvido por Zé Picuinha, que me esperava no setor de desembarque. No trajeto até o hotel gaivota trocamos informações, comentamos o despreparo intelectual dos candidatos nos debates eleitorais e mais algumas informações sobre a arte na Beócia.
À noite, no horário previsto, já me encontrava no auditório, sentei próximo ao palco, e, curioso, a palestra começou pontualmente. Após cumprimentar a plateia. Um silêncio sepulcral se fez presente, todos queiram ouvir. Zé Picuinha cumprimentou a todos e foi direto ao assunto da palestra.
O Direito é uma das ciências que não foi criada pela natureza. Uma ciência criada pelo homem não pode funcionar bem, pois depende do que o homem comeu na noite anterior; uma canetada, e tudo muda. O democrata democratiza e o ditador dita.
Normas, condutas, história, sociologia, alternatividade e natureza são desprezadas rapidamente, a depender da conveniência do poder vigente. Na verdade, o Direito serve para empregar milhares de pessoas. Nenhuma ciência emprega tanta gente quanto o Direito. Diz o ditado popular: enquanto brigam os aldeães, vivem os advogados, os juízes, os demais e os escrivães. Enfim, o direito é o maior empregador do mundo, mais grave, não funciona.
Senhores; continuou: o Direito não serve para nada. Não digo que é uma piada, pois uma piada serve para nos fazer sorrir. O Direito é nada. Naquele instante um estudante gritou: Direito é norma, Picuinha respondeu: não vale como verdade; um marxista gritou que a visão do direito que vale é a de Marx, respondeu continua sendo nada. Os anarquistas presentes aplaudiram, e começou uma loucura no auditório, Zé saiu às pressas e o Diretor da Faculdade de Direito foi atingido na cabeça por um vade-mécum, sofrendo traumatismo craniano. Foi socorrido pela ambulância do serviço público, mas morreu antes de ser levado para o hospital, pois havia uma discussão se ele tinha o direito àquela assistência, o que demorou bastante para ser decidido.
Ao longe, escutava-se os gritos de Zé Picuinha, afirmando que o Direito perderia todo o prestígio que tem no dia em que estabelecerem uma grande rede de políticas públicas, quando o Estado cumprir o seu papel de garantidor da cidadania, estabelecendo a consciência ética como parâmetro de comportamento. Poucos ouviram aqueles gritos, já distantes. VC081114