Jorge Maia
Na segunda metade da década de sessenta, assisti a um programa de calouros pela televisão. Naquela época V. da Conquista já recebia sinal da TV Tupi, o qual chegava através da Embratel. No mencionado programa apresentou-se um calouro, cujo mérito maior era, com sua voz anasalada e alguns trejeitos, tentar parecer um dos ídolos do momento. Leia na íntegra.
Ocorreram, entretanto, algumas dificuldades de comunicação entre o calouro e o apresentador do programa, Carlos Imperial, o que terminou em críticas ásperas contra o candidato a cantor. Lembro-me que, entre outras críticas, o candidato foi acusado de não saber usar o diafragma no controle da respiração.
Foi a primeira vez que eu ouvia falar em diafragma, e, o mais grave, que ele servia para ajudar a cantar.Procurei informar-me e passei a saber que o diafragma é um músculo largo que separa a cavidade abdominal. Não sei o que valeu o aprendizado. Não me lembro de haver utilizado o meu diafragma. Quem sabe, fui um descuidado! E pela lei do uso e desuso, no meu caso, pelo desuso, já não tenha um diafragma atrofiado?
Mas o largo músculo parece perseguir-me. Sempre aparece em uma conversa, em um texto. Busca uma desculpa para ser pronunciado. Outro dia, em uma conversa informal, alguém falou em diafragma. Eu querendo mostrar erudição, perguntei, preparando-me para responder, o que é diafragma? Alguém respondeu: é um método de controle da natalidade. Só naquele momento é que percebi que a palavra servia para indicar mais de uma “coisa” e que as máquinas fotográficas também o possui.
Certa vez ouvi um amigo falando que o homem é um ser diafragmático. Não poderia perder a oportunidade de aprender mais alguma coisa sobre o tal músculo. Passei a perguntar o significado daquela afirmação, pois ao ouvi-la compreendi que o diafragma havia sido promovido. Deixava de ser um divisor da caixa torácica e passava a comandar o destino do homem.
Fiquei apreensivo, era uma afirmação que colocava em confronto toda a filosofia ocidental. Naquele momento compreendi o perigo que rondava a nossa civilização. Antes, alguém já falara que o homem é um bípede sem plumas(pré-socráticos?). Fiquei a pensar o que faríamos com Aristóteles, Descartes, Heigel e Kant, sem esquecer Marx.
Demonstrei curiosidade, procurando obter uma explicação. A resposta é que o homem possui suas maiores preocupações localizadas abaixo do diafragma: o bolso, onde fica o dinheiro e por último, porém não menos importante,o sexo. Respirando com mais tranquilidade, usando um o pouco o diafragma, percebi que o mundo teria o seu curso normal e a humanidade estava salva.
Certo dia, Jorginho, onze anos, perguntou-me por que Pavarotti aguentava cantar prolongando tanto a voz. Compreendi o que ele queria saber, e, repetindo a antiga lição, informei-o sobre o uso do diafragma, o qual se bem utilizado, ajuda a controlar a respiração, dando mais resistência vocal.
Alguns dias depois, Jorginho entra no meu quarto, esbaforido, realmente muito agitado, em desespero, gritando: meu pai, eu consegui! Eu consegui! Fiquei confuso diante de tanta euforia. Não podia imaginar o que estava acontecendo. Procurei acalma-lo. Eu estava ansioso para saber o que ele havia conseguido.
Imaginei que tivesse “zerado” um novo jogo no vídeo game. Não era isso. Era algo mais importante.- Sim, o que? Diga menino! Respondeu: eu consegui cantar usando aquilo que Pavarotti tem na barriga. O diafragma atacava outra vez. VCsetembro1996