Jorge Maia
Um escritório de advocacia costuma ser um laboratório das mais diversas manifestações das paixões humanas. Tantas são as experiências vividas pelo advogado em seu escritório, que um profissional da Psicologia ou da Psiquiatria ficaria com inveja. Diante do advogado está muito mais que as paixões. Na verdade desfila naquele palco todo um conjunto de interesses, os quais denunciam toda a grandeza e mesquinhez do ser humano. É simplesmente surpreendente. Há momentos em que não acreditamos no que ouvimos. Leia na íntegra.
No escritório de Advocacia não tem divã, mas diante da sua mesa são colocadas duas cadeiras, onde lado a lado, sentam, algumas contendores, os quais disputam os mesmos valores, no mais amplo sentido, cuja natureza são as mais variadas. Tudo isso vai, desde os mais altos interesses financeiros e patrimoniais, até as mais rasteiras das vinganças. Contra tudo isso o profissional deve estar vacinado.
Quando tratamos de um caso de infidelidade conjugal, então temos um grave problema. Os fatos tomam um rumo nebuloso, e é preciso muita paciência do advogado para tolerar as pirraças despejadas reciprocamente. Assisti a cenas impublicáveis. Isso por dois motivos: o absurdo do fato e a questão ética do dever do advogado guardar segredo sobre os casos que lhe são apresentados.
Tenho diverso exemplos que fariam corar qualquer pessoa que tenha um mínimo de senso. Dentre tantos casos, lembro-me de um bem engraçado, o qual passo a narrar, sem causar danos às partes interessadas. Tantos são os anos passados, que certamente nem se lembram mais. Tenho ainda a segurança de não serão identificados, pois não se reconheceriam diante dos fatos aqui narrados. As pessoas sempre esquecem o ridículo que praticam diante de certas situações.
Um casal procurou-me para realizar a separação judicial. Não estavam vivendo bem.Era melhor separar e para isso era tornava-se necessário, dentre outras exigências, a divisão do patrimônio do casal. Eram poucas coisas e não muito valiosas. Entretanto foi trabalhosa a partilha, negociadas seguiram por semanas a fio. Até que um dia, cansado, de tanto ouvir o casal, decidi marcar uma tarde, quando discutiríamos o assunto à exaustão e poríamos fim àquela discussão.
Chegamos pontualmente ao escritório, onde nos isolamos e pedi à secretária para não ser interrompido. Às dezoito horas, estressado e louco para chegar em casa, fechamos um acordo. Cumprimentei o ex- casal, combinando para o dia seguinte a formalização do acordo.
Já fora da sala, a mulher retornou e disse: espera ai! Fiquei gelado: o cachorro eu levo. Eu não acreditei no que ouvi, mas surpreendentemente, ele respondeu: eu deixo levar o gato, o cachorro, não. Perplexo, diante de tais comentários, convenci a mulher a deixar o cão com o seu ex-marido. Ela num último gesto de provocação disse: tudo bem, mas se passar por sua rua e ele me seguir, eu não tenho culpa. VC1996.
Uma Resposta para “O cão bem amado”
Olympio
Bom texto professor Jorge Maia.
Estou adorando essas crônicas que o senhor esta fazendo toda semana.
Dá até uma saudade de ter tido o privilégio de ter sido seu aluno.
E, mesmo com todos esses anos de advocacia aposto que vez o outra aparece Divórcios com esse nível avançado de divisão.
Eu quando vejo um casal em uma disputa acirrada como esta tenho vontade de correr quilômetros.
Um abração,
Olympio Benicio.