8 de Março, dia de luto ou de comemoração?

Foto: Blog do Anderson
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Elane Ferraz dos Santos

O 8 de Março, dia Internacional da Mulher, continua sendo um dia de luto, de luta e de poucas comemorações! Ainda não podemos realizar a festa da igualdade, da equidade, da solidariedade, do respeito, do amor e dizer que vivemos numa sociedade com direitos e oportunidades iguais! As vitórias e conquistas alcançadas por nós são frutos da nossa determinação e coragem. Enfrentar no dia a dia o regime machista, herança secular que prevalece no mundo inteiro (daí o Dia ser Internacional) é uma tarefa difícil e dura, que exige de nós uma força maior que nos move e nos impulsiona. O dia de hoje é mais uma oportunidade que temos para fazer um balanço de mais de 200 anos de movimento feminista e entender que muitas transformações aconteceram e estão em curso, mas, são muito lentas, pois se trata de mudanças do comportamento das pessoas e de transformações profundas de estruturas e instituições alicerçadas sobre a herança machista. Além desse balanço, é dia também de renovar nosso compromisso de luta, na certeza de que a sonhada igualdade um dia chegará, nem que seja para as gerações futuras. Leia na íntegra a opinião de Elane Ferraz dos Santos.

Enganam-se aqueles que pensam que não há necessidade de instâncias para elaborar políticas públicas para mulheres e acham que a questão é apenas interdisciplinar as várias ações públicas; não, a questão é muito mais abrangente e profunda, sobretudo pelo tipo de sociedade em que vivemos e pela postura machista da maioria dos homens. Neste sentido, há de ter uma clareza: nós feministas, que lutamos cotidianamente pela igualdade, estamos sempre no confronto com o machismo que representa exatamente a manutenção da “superioridade” masculina; portanto, somo obrigadas a um confronto cotidiano em todos os espaços, desde a família e o trabalho, até a cultura, a religião e, principalmente, a política. É neste espaço que a luta se faz mais difícil e desigual, pois é justamente ali onde o machismo impera e se reproduz. Precisamos avançar muito mais a fim de estabelecer neste campo núcleos de militantes que elaborem e articulem propostas inovadoras em vista da igualdade de gênero. E isto não cairá do céu; é preciso que nós, mulheres, ocupemos espaços e cargos estratégicos. Caso contrário, nunca haveremos de alcançar nosso efetivo empoderamento, criando condições de igualdade de gênero com informação, participação e políticas educativas e preventivas. O que conquistamos, até hoje, são leis de enfrentamento da violência contra a mulher, tema que cada vez é mais recorrente, o que nos incomoda muito.

Em todos os níveis da organização da sociedade, seja ela política, religiosa, econômica,  cultural ou familiar, vivenciamos ainda desigualdade de oportunidades, de reconhecimento e de espaço; no entanto, conquistamos também avanços que nos qualificam cada vez mais. Do ponto de vista da participação política, em se tratando da realidade internacional, atualmente somente 10% dos principais governos democráticos no mundo são chefiados por mulheres: são 19 mulheres chefes de governo em países de grande importância mundial como Alemanha, Argentina, Bangladesh, Brasil, Croácia, Chile, Coréia do Sul, Dinamarca, Escócia, Jamaica, Kosovo, Letônia, Libéria, Lituânia, Malta, Noruega, Polônia, Trinidad e Tobago e República Centro-Africana. Aqui no Brasil, nas eleições de 2014 não houve grande avanço. A nossa participação não passa de 10,6% no Congresso e no Senado e temos apenas uma governadora (Roraima).

Quanto à questão econômica, há um crescimento na ocupação de vagas de emprego e no aumento salarial. Recentemente, uma pesquisa em São Paulo aponta que a mulher ainda ganha menos que os homens, porém a diferença vem diminuindo na grande São Paulo: 54% para os homens contra 45,7% para  mulheres.

Dia 8 de Março, dia de luto ou de comemoração? A instalação da Vara Doméstica de Violência contra a Mulher em nossa cidade, acontecida no dia 02 de março 2015, sem dúvida nenhuma é motivo de comemoração, mesmo se o judiciário fez a implantação sem a participação prévia das entidades, dos movimentos e das mulheres em geral, que ao longo desses anos vinham lutando para a instalação da mesma;  também a aprovação do projeto que define o feminicídio como circunstância qualificadora de homicídio, pela Câmara dos Deputados no dia 03 de março deste ano também é motivo de comemoração. Trata-se do enfrentamento concreto à violência que vem sofrendo as mulheres, já que dados divulgados pelo IPEA, (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) estima que entre 2001 a 2011, aconteceram mais de 50 mil feminicídios – assassinato de uma mulher motivado por questão de gênero, violência doméstica e/ou sexual. No Brasil, há cerca de cinco mil mortes por ano vítimas desse crime; temos também que comemorar que desde que a Lei Maria da Penha entrou em vigor, em 2006, a taxa de homicídios domésticos caiu 10%, segundo o mesmo Instituto. Pena que a nossa festa se resume somente na conquista de instrumentos de enfrentamento a violência contra a mulher!

Ainda haveremos de ver a igualdade de gêneros, mas tem muito caminho a percorrer. Os movimentos de mulheres e as mulheres em movimento constante é que vão desafiar o sistema e promover mudanças que possibilitem uma nova relação entre as pessoas. Relação permeada de respeito, tolerância e amor; hoje, o que impera, infelizmente é a violência e o luto!


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