Jeremias Macário
Ruídos e interferências desconexas no início de 1964 terminaram em gemidos e ranger de dentes. Nos anos seguintes estudantes, intelectuais, artistas e outras categorias foram às ruas contra a ditadura e pela democracia. O movimento pelas Diretas Já de 1984, como o próprio nome diz, pedia eleições diretas. Essas manifestações e outras posteriores tinham alvos certos e praticamente não dividiam a população em duas correntes políticas, a situação e a oposição. Leia na íntegra a opinião de Jeremias Macário.
Agora nós escutamos vozes desafinadas e desalinhadas com a situação na qual vivemos. Na sexta-feira passada, vimos uma organização oficial dos estudantes e dos trabalhadores que estão atrelados ao governo (pena que não temos mais uma UNE representativa e independente). No domingo, o lado “B”, por assim dizer, que perdeu as eleições, reagiu com vozes desafinadas que gritaram fora Dilma e até defenderam uma intervenção militar no país.
Na minha humilde concepção, o alvo deveria ser a moralização do Brasil, em benefício de toda coletividade. Muitos foram às ruas só para destilar sua raiva com queixas individuais e apoiar na onda vozes destoantes, sem medir as consequências. Quem pede o impeachment da presidente pouco enxerga que por trás dela tem a cambada de Michel Temer mais os abomináveis Eduardo Cunha (presidente da Câmara) e Renan Calheiros (presidente do Senado), dentre outros diletos “companheiros”.
Com eles comandando diretamente o poder, só para começar, todo processo de investigação da Operação Laja Jato da Petrobrás será detonado para tirar seus nomes da lista. A situação atual e o quadro de políticos que temos hoje não são os mesmos do impeachment de Fernando Collor em 1992 quando Itamar Franco assumiu a presidência da República. No momento, não dá para arriscar e depois partir para o suicídio.
Nas duas últimas manifestações que, na minha impressão, soaram mais como campanha política, quase nada se viu nos cartazes e faixas de alusões contra as mordomias e os desmandos do poder legislativo que há muitos anos virou as costas para o povo. É demais ouvir do presidente da Câmara, o Eduardo Cunha, que a corrupção só está no executivo. É debochar com a opinião pública.
Dos 2,3 milhões de pessoas que foram às ruas no domingo se escutou muita aversão ao PT e fora Dilma. Como se não bastasse, um grupo pregou intervenção militar por uns tempos enquanto se marca novas eleições. É ser muito ingênuo e não conhecer nada da história o senhor que falou essas asneiras. O pior é que ele foi aplaudido por muitos. Em 1964, os generais tomaram o poder prometendo realizar eleições no ano seguinte (1965) e levaram a ditadura a ferro até o final dos anos 80.
Queria saber quem está atrás desse Movimento Brasil Livre e quem é esse senhor Adolfo Sachsida que comanda o grupo? E os Revoltados Online? É preciso muito cuidado para não cairmos numa arapuca ainda maior que leve o Brasil para uma ditadura. Acredito que a maioria não quer que isso aconteça. Por isso é que precisamos estar vigilantes e bater firme nesses caras malucos e inconsequentes.
Não estou aqui para apoiar as trapalhadas e desvios de políticos do PT e de dona Dilma. Todas as vezes que ocorrem manifestações, a presidente diz que ouviu o clamor do povo. Não basta ouvir e dizer que são compreensíveis os protestos, mas agir para conter os estragos causados pelo rompimento da barragem.
Toda vez que tem um movimento, o executivo manda um projeto para o Congresso, Desta vez foi o pacote anticorrupção. Queria saber onde anda o pedido do projeto de reforma política, gerado em decorrência dos movimentos de 2013? Foi para inglês ver? Basta de brincadeira e enrolação!
Não basta só os ministros ficarem de plantão para rebater os movimentos de que são coisas armadas da oposição; dinâmica próxima das eleições passadas; ou de pessoas da classe média alta que querem o ver o “quanto pior melhor”. Quem está nessa linha são os desafinados.
Não dá mais para ficar enganando de que a crise internacional e a seca são os verdadeiros culpados pela quadro crítico atual que atravessa o país, com inflação alta, moeda desvalorizada, recessão econômica e desemprego, sem falar nas mazelas da corrupção, saúde, educação da segurança pública descendo a ladeira em disparada. “Quem sabe faz a hora”.
Estas vozes desafinadas podem tomar outras proporções desastrosas se os poderes constituídos não tomarem logo medidas moralizantes, como acabar com as ladroagens e o Congresso também fazer seus ajustes e nos respeitar. Há muito tempo que a nação está se sentindo encurralada e muitos começam a fazer apelos irracionais e perigosos. Os aproveitadores e oportunistas estão aí de plantão para atendê-los como já ocorreu em passado recente da nossa história.
Uma Resposta para “Vozes desafinadas”
edwaldo alves silva
Caro Jeremias,
Comungo com vc sobre o risco de se alardear a necessidade de uma intervenção militar. Apenas os ignorantes de nossa história desconhecem os prejuízos que provocam a quebra da ordem institucional e da legalidade. E, ainda, não são golpes militares que inibem a corrupção. Não se esqueça da transamazônica, ponte rio-niteroi, itaipu e tantas outras obras faraônicas que serviram para encher os bolsos de empreiteiras e governantes.
Parabéns.