Descolar carona, nos tempos da faculdade, em Vitória da Conquista, era tarefa difícil para um aluno recém-chegado à Universidade do Sudoeste. Os colegas, exceto um ou outro, não tinham carro. Por sua vez, e por razão desconhecida, os professores não costumavam atender aos apelos dos alunos e passavam ligeiro, fugidios. Lá estava eu, certa feita, parado no ponto de ônibus defronte ao então supermercado Cedisa, na avenida Olívia Flores, tentando desesperadamente economizar o vale transporte quando, numa última tentativa, levanto o braço para um Gol cinza que seguia na direção da UESB. O carro para e eu corro até ele. O motorista era um tanto baixo, magricela, sujeito de cabelo curto e sorriso largo. Jorge Luiz Melquisedeque. Quis saber o curso que fazia, de onde vinha, onde morava… E nessa rápida carona até o campus, aquele homem das artes (escritor, roteirista, publicitário, cinéfilo, cantor..) me apresentou, não à toa, um outro homem que se tornaria, pra mim, o maior de todos os cronistas do sertão, cantador da melhor cepa, criador de cabras, bodes e marrãs: Elomar Figueira Mello – “um gênio” nas palavras de Jorge. Foi ele quem me pôs a ouvir, ali mesmo, pela primeira vez, o fabuloso Auto da Catingueira: “ah vida tirana tu ina vai mudá”. Pouco tempo depois, ironicamente, seria eu uma das primeiras pessoas a receber, na redação da TV Sudoeste, a terrível notícia da morte de Jorge, barbaramente assassinado e em circunstâncias ainda agora, treze anos depois, cercadas de mistério. Por algum motivo, hoje, me pus a relembrá-lo. Talvez por sentir a falta que nos faz, nesses dias estranhos, de um “reacionarismo” assustador, a iluminada e libertadora presença de Jorge Luiz Melquisedeque, homem tão extraordinário que chega a parecer, por que não, saído da obra do próprio Elomar: “Manso passô a vida intera/ê/Mais morreu sem temê nada/ai”.
Jorge Melquisedeque
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