Jorge Maia
O tradutor pode ser um traidor, mas quem faz uma versão pode ser muito mais perigoso. A arte de traduzir é fascinante, quando alguém consegue dar vida em outro idioma ao que foi expressado de modo tão característico em outra língua. Costumes, jeito de ser, valores inerentes transportados em seus significados para uma outra gente em seu idioma acompanhado dos valores da outra cultura. Leia na íntegra.
Podemos imaginar a tradução de Grandes Sertões Veredas para o alemão? Sei por ouvir de dizer que Guimarães Rosas fez tal tradução, deve ter sido algo desafiante levar para o alemão as falas regionais daqueles personagens. Coisa de gênio. Outra tarefa difícil é a apresentação de um livro. Simplesmente memorável é a apresentação de Oto Maria Carpeaux faz em uma das edições de ” O Fausto”, certamente já fora de edição, vale por um outro livro.
Ontem resolvi ouvir ” Sound of silence” Simon and Garfunkel, recordando um tempo de certo modo já distante. Primeiro ouvi em silêncio aquela harmonia, aquela afinação. Depois tentei entender em inglês, não foi fácil, tentei o google e encontrei traduções das quais não gostei, porém há uma que satisfaz e que reproduz de modo a fazer sentido em português a letra em inglês.
A melodia é bonita, a letra não fica nada a dever. A situação descrita pelo autor nos remete a um silêncio amedrontado onde nos refugiamos, um tanto sem esperança . Um desses silêncios que frequentemente “ouvimos” quando tudo é perplexidade e não sabemos que rumo tomar. Apenas ficamos a espera de que algo vai acontecer e que no final tudo dará certo.
Confesso que a tradução que mais me agradou deixou-me mais triste que alegre, pois remeteu-me a um questionamento sobre o que está perto para acontecer. A música que era para alegrar e matar a saudade deixou-me reflexivo. Bom, depois eu resolvo isso.
Aquela reflexão contribuiu para lembrar que a tradução ou a apresentação de uma obra pode degenerá-la; é o caso de ” sound of silence” que tem uma versa lacrimosa em Português e que faz casais apaixonados suspirarem arfantemente, quem sabe em soluços, sem que jamais saibam a mensagem contida no original. Bem, talvez seja uma benção.190715