Gustavo de Magalhães
Continuo recordando minhas andanças, nesses vinte e seis anos atuando como advogado, e as vezes contando os causos da minha vida como um todo, não somente relacionados ao direito. Mas percebi que muita gente continua sem acreditar que, o que conto, realmente aconteceu comigo ou vivenciei. Parecem que minhas histórias não são reais, mas sim amigos, são muito reais! Afinal, não iria inventar que cai numa fossa: que vantagem teria, a não ser virar herói melado!? Sinto, por vezes, que tem uma comoção popular, e muitos ficam com dó. Minha mãe mesmo, Licinha, me dá altas broncas, me recriminando. Mãe maravilhosa, não se preocupe, estou muito bem… Leia na íntegra.
Aviso então aos demais: não fiquem comovidos! Eu me diverti!
Levar a vida na esportiva sempre foi minha tônica, porque acho que devemos atrair coisas boas, e se fiz alguém rir com meus causos, sei que esta pessoa me enviará uma boa energia. Além do que, alguém conhece um gordo que não seja bonachão ou de bem com a vida? Faz o que gosta: come! Um dos maiores prazeres da vida, mesmo que depois caia no arrependimento.
Mas hoje vou maneirar… diminuir na intensidade, contar algo que não aconteceu comigo, mas não deixa de ser muito engraçado e na próxima pego pesado.
Voltemos às andanças, e estava eu em Teixeira de Freitas, onde atuei muitos anos e conheci doutor Paulo Temporal Soares (observem que o seu nome já é uma contradição, digno de nota, porque se é temporal, não poderia ser só ares… meu Deus que trocadilho infame…).
Na mesa de audiências trabalhista, doutora Ecy Padilha, uma das maiores advogadas que conheço, com a qual tive a honra de trabalhar e viajar de carona, segurando seus dois cachorrinhos, que não podiam balançar senão enjoavam, e poderiam vomitar (em mim!). Comiam apenas filé, e eu vinha que nem estátua (obesa) de Itamaraju para Itabuna, sem me mexer, teso, pra não assustar os bichos, e lógico, não ganhar uma gofada canina (já não basta a fossa?).
Naquele dia, faziam ela e mais um colega, acordo nos tempos (Cairo e Paola, amigos também juízes, vão me matar porque disse assim de forma tão coloquial) do trabalhador rural; um veizim (sotaque delicioso de Conquista), beirando seus oitenta anos, surdo que nem uma porta veia. O patrão fez uma proposta, e a nossa colega muito abafada, rainha da mesa de audiência, com varias reclamações ao mesmo tempo, não percebeu que talvez fosse pouco ao que todos esperavam, inclusive um neto do seu cliente, um rapaz de uns dois metros de altura, por uns dois de largura, encostado no fundo da sala, só observando a cena.
O juiz, Temporal, adiantando seu lado, doido pra encerrar mais aquele dia, pergunta, a ela, que estava de cabeça baixa, “e ai doutora, seu cliente aceita o acordo?” Balançando a cabeça sem levantar as vistas, ela faz sinal que sim.
Nesse instante, eu que acompanhava a audiência, olho para o fundo da sala, e vejo aquele homenzarrão desabar em linha reta, caindo de cara no chão de taco (quem não se lembra, com aquele cheiro de cera vermelha), fazendo um barulho enorme, ensurdecedor, que tremeu tudo… scataplum… e começar a se debater feito peixe fora d’ agua. Eu, que não era tão menor do que ele, na minha agilidade slow motion, fiz menção de me mover, mas fui contido com o grito de Temporal, “o homem caiiiiiuuuuu”. Foi o sinal para o inicio do caos! Ecy levantou a cabeça, e por sua vez com o choque de ver aquela cena, desfalece em plena mesa de audiências. E agora duvida cruel, salvo o cidadão monstruoso ou a minha fonte de caronas? Obvio que fui cuidar de minha colega; e a balburdia foi formada, corre gente pra um lado, corre serventuários da justiça para o outro lado, chama médico, guincho, verdadeiro pânico, no calor infernal de Teixeira de Freitas, sol descendo no horizonte, bola de fogo.
No meio disso tudo, o veizim, sentadinho no mesmo lugar, em meio aquela zona barulhenta, que surdo e já senil, não entendeu absolutamente nada, com os olhos voltados para o horizonte. Foi o único que não se assustou, e certamente morreu sem saber o que tinha provocado o seu acordo. Ficou feliz, porque o patrão deu seus tempos, e deve ter comprado uma terrinha, lá perto de um riozinho, cuidado de umas galinhas, um gadinho… ([email protected].whatsapp para comentários 077-99198-2859)