Jorge Maia: a japona e a sandália japonesa

Foto: BLOG DO ANDERSON
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Jorge Maia

Eu era menino, e não faz muito tempo, e tinha meus sonhos de consumo, o que era perfeitamente normal. Dentre aqueles desejos havia um que era especial, sempre lembrado por ocasião do inverno daquela época em nossa cidade. Era muito frio. Nunca fiquei sem agasalhos. Eu sempre tinha minhas roupas de lã para enfrentar aquele tempo de tão baixas temperaturas. Confesso que havia certa elegância, que por modéstia deixo de descrever com maiores minúcias. Isso não é novidade, pois as roupas de inverno nos tornam um pouco mais elegantes. Leia na íntegra.

O que ocorria, é que estava na moda um tipo de blusa fabricada inicialmente no Japão. Era um tipo de blusão de nylon, com costuras externas em formato de figuras geométricas, tais quais losângulos e retângulos. Era muito acolchoada por dentro, desafiando o frio. Sem contar com a importância que a blusa dava a quem a usava.

O certo é que eu nunca podia comprar uma blusa daquela, era cara e faltava dinheiro para comprar daquele tipo que eu desejava. O tempo passa, o frio diminui, por diversas razões, e aquela blusa mudou de cores, tipos e preços, agora possibilitando-me adquirir uma delas. Bom, o tempo reduziu a vontade de ter uma daquelas blusas de frio.

No inverno de 2012, muito frio, resolvi que era a hora de comprar a tal blusa. Enfim, a satisfação de um desejo de infância atendido. Ocorre, meus sete leitores, é que aquele tipo de blusa de frio era chamado de “japona” porquê fora criado pelos japoneses, então era comum você pedir nas lojas: quero ver os tipos de japonas que você tem.

O ano era 2012, muitos anos depois do sucesso daquele tipo de blusa de frio, e eu me dirigi a uma loja e pedi para ver algumas japonas. O vendedor pediu para eu repetir e eu disse que queria ver umas japonas. Ele respondeu que não sabia o que era. Fiquei perplexo. Por mais que eu o explicasse não sabia o que eu queria. Desisti e procurei em outras lojas e ninguém sabia o que era a tal japona.

Meio sem graça, sentindo-me deslocado no tempo e um pouco irritado com tamanha ignorância, busquei em outras lojas e a resposta era sempre a mesma: não sei o que é. Na última loja visitada, depois de muitas explicações, o vendedor disse: ah, o senhor quer uma jaqueta. Meu mundo caiu, o objeto do desejo havia mudado de nome, certamente para que eu não o encontrasse. Fiquei sem graça e sai sem querer examinar a tal jaqueta.

Mais a surpresa não ficou somente aí. Resolvi comprara um par de sandálias japonesas e os vendedores, todos jovens, ninguém sabia o que era. Achei que era um complô contra mim e contra os produtos japoneses e somente depois é que descobrir que agora aquelas sandálias têm outro nome, e o nome é uma marca.

Passei a meditar sobre as mudanças do mundo. Até as coisas mudam de nome. O que permanece imutável é a forma de governar o mundo. Os faraós embalsamados, em todo o mundo, continuam mandando da mesma fora de antigamente. 011125.


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