Gustavo de Magalhães | Advogado | gustavodemagalhaes@hotmail.
Não é fácil agradar sempre, mas às vezes são pequenos detalhes, ou nuances que nos salvam de situações mais complicadas. Aprendi com um amigo meu empresário lá de Ilhéus (o mesmo que fazia caretas para os ex empregados que reclamavam contra ele na justiça do trabalho, e que chutava suas canelas), que agradar pessoas importantes era bem mais fácil, sempre com coisas bem simples. Leia na íntegra.
Por exemplo: se você pretende obter um empréstimo de grande valor junto a um grande banco, e depende da assinatura de um executivo que você quer agradar, não ofereça bebidas caras, jóias, presentes caros; leve carne de sol de Itororó, farinha de Buerarema, bala de atum (se você não sabe o que é bala de atum, precisamos muito conversar…), ximango, biscoito avuador, ou até pocazoi (sinto um pouco de duvidas em meus leitores… precisamos mesmo conversar).
Ele contava que adentrava os escritórios luxuosos dos grandes bancos, com um farnel, cheio de besteira, que fazia grande efeito.
Vou mais além, pois entendo que às vezes nem oferecer presente funciona, ainda mais nesse tempo onde o Japa de Curitiba acha que tudo é propina. Mas levar um sorriso, um comentário simpático, uma palavra de carinho, uma bênção. Sim, bênção, porque lá fora, em outros estados, todos estão certos que os habitantes da Bahia integralmente têm o pé no dendê; todos tocamos tambor, e recebemos santo. Nada contra, porque eu mesmo adorava comer a pipoca, as balas e o caruru de Cosme (e Damião).
Fui usar essa tática outro dia em Brasília, onde fui sustentar um processo junto ao tribunal de segunda instancia, e antes normalmente visitamos os desembargadores, para demonstrarmos nossas razões para o julgamento do dia seguinte.
Aquela desembargadora era muito tranqüila, me recebeu em seu gabinete, e eu fiz toda a exposição de motivos e das minhas razões de pedir para o julgamento, com obvia demonstração da importância que temos que dar ao caso de cada cliente.
Notei que ela demonstrou interesse e prometeu estudar os pedidos de meu cliente. Mas eu tinha que marcar aquele momento, e ao sair, vi acima de sua cabeça uma moldura com um anjo, e taquei sem pensar: “doutora, e como baiano, trago um axé de todos os santos, e peço a proteção do pai e dos orixás guerreiros, que cuidarão de sua vida…”
Sincretismo pouco é bobagem!
Chega o dia do julgamento, agora ela não está sozinha, e mais dois desembargadores com ela poderiam mudar todo o julgamento.
Na tribuna visto a toga preta (uma capa que nos obriga a Lei a usar, em que pese o calor infernal de nervoso e do acréscimo do paletó), e me senti quase um sacerdote, e como todos estavam de cabeça baixa sem me notar, metralhei logo que trazia da Bahia o Axé de Pai Pedro (o maior pai de santo de Ilhéus), a proteção de Oxossi Guerreiro e de Iansã, e a bênção de todos os Santos.
Senti que todos os olhares se voltaram para mim, e vi o sorriso estampado na desembargadora, que deve ter se lembrado de minhas razões que expus com tamanho afinco no seu gabinete, pois consegui que aquele dia o processo fosse julgado a favor do meu cliente.
Recentemente mais uma vez estava eu defendendo outro caso no mesmo tribunal, mas com outro desembargador. Com esse não tive tempo de ir antes expor minhas razões, mas já tinha a primeira experiência positiva anterior, então era fácil. Bastava repetir o evento de sucesso.
Visto a capa de Batman, digo, Toga, e aguardo o momento certo para saudar o desembargador presidente, e lanço meu chavão, certo do efeito bombástico sobre os três julgadores.
Realmente teve, aos dois outros julgadores, mas não com o relator, a quem eu me dirigia, e seu voto não foi favorável. Sorte que mais na frente eu conseguiria uma decisão do pleno, ou quando todos os julgadores participam.
Nesse dia fui de novo participar do julgamento, intimidado, cauteloso, fiz minha parte simples sem a saudação. Ao sair, passei pelo relator, cumprimentei-o, sentindo um pouco de afastamento do mesmo, aliado a um olhar atravessado.
Atrás de mim, outro colega advogado, que tinha acabado de sustentar também um processo seu, lhe cumprimenta: “a paz do Senhor, Desembargador…”
É… Definitivamente, não se pode agradar a todos! ([email protected], whatsapp 77-99198-2859)