Jeremias Macário | Jornalista | [email protected]
Agora que o rio São Francisco está mais encorpado com as águas que caíram em janeiro em toda Bahia e Minas Gerais, é muito prazeroso fazer um tour de barco de Juazeiro até a Barragem do Sobradinho, curtindo as belas paisagens. Mas, o turista não sabe é da raiva que vai passar até alcançar o maior lago artificial da América Latina que com seca reduziu sua capacidade para menos de 10%, com vazão de 800 metros por segundo. Ao passar na primeira eclusa que se fecha aos poucos enquanto a barragem solta água para que haja um nivelamento, o guia turístico anuncia com estardalhaço para que todos do barco fiquem atentos para o grande feito da engenharia quando em dez minutos se dará o processo de transporte de um lado para o outro.
Acontece que a segunda eclusa, que deveria baixar para a passagem do barco, emperra e as pessoas ficam presas no vão por mais de uma hora (até quando deixei o local) na espera do prometido. Não suportei ver a agonia, no último domingo (dia 31/01), de um único funcionário da Chesf andando de um lado para o outro entre as máquinas, tentando baixar a eclusa. O empregado, naquele calor do sertão, coçava a cabeça, colocava a mão para aparar o sol, e só dizia que “o negócio tava russo”. Acionava botão ali e acolá e nada funcionava. Alguns comentavam que se fosse na Rússia o problema já teria sido resolvido. De lá de cima da barragem só via o barco apertado no paredão de concreto. O que ainda acalmava os turistas ansiosos era o som do samba e do pagode. Imaginei minha irritação ali dentro, ou o caso de uma pessoa (criança ou idosa) passando mal sem poder ser socorrida. Leia na íntegra.
Também queria ver a eclusa baixar e os barcos (outro já estava preparado para descer o rio) se cruzarem para tirar uma bela foto. Do lado de cá não suportei a espera e segui minha viagem de passeio sem saber o resultado, pensando comigo: Isto é a cara do nosso belo Brasil. Antes disso, porém, dei um dedo de prosa com seu Valdemar que vendia coco gelado do outro lado e tinha antes me orientado como me posicionar para tirar belas fotos. Ele começou a dizer que aquele problema era constante, quando um amigo lhe avisou que eu era jornalista e era bom não falar muito.
Foi aí que ele abriu o verbo e contou que já havia trabalhado por 30 anos na Chesf, comparando aqueles tempos com os de hoje em decadência. Contou que no meado de janeiro a embaixadora da Venezuela ficou presa por horas no mesmo lugar na espera que a eclusa baixasse para que o barco avançasse lago adentro. Os representantes brasileiros devem ter pedido desculpas à embaixadora e dito que o problema aconteceu pela primeira vez, mas seu Valdemar confirmou que é sempre assim. Outro fato que me chamou a atenção como visitante foi quando soube que por ali havia passado o engenheiro chefe do setor e foi embora para seu domingo de lazer, sem dar a mínima para a aflição do funcionário que continuava tentando baixar a eclusa, sem sucesso. Segundo seu Valdemar, ele apenas olhou, e referindo-se à Chesf disse: “Não é assim que eles querem”?
Ao embarcarem em Juazeiro para a viagem até a Barragem do Sobradinho, os turistas são comunicados do tempo de ida e volta, com previsão de retorno, mas não sabem que a eclusa sempre está com defeito. Simplesmente são iludidos com a propaganda enganosa. É por estas e outras que o turismo na Bahia só faz cair cada vez mais. Entre uma conversa e outra, seu Valdemar, que todos os dias está ali vendendo seu coco e acompanha tudo de perto, adiantou ainda que, por questão de doença, o funcionário que estava tentando baixar a eclusa nem podia estar trabalhando naquela função. Nem ele entende o que está se passando com a Chesf.
Uma Resposta para “Jeremias Macário: A eclusa que não funciona”
Dantas de BH
Sempre desejei fazer esse passeio. Mas, depois desse seu alerta, definitivamente, tô fora. É muito descaso. Já dizia o ditado: “Pensem em um absurdo, a Bahia tem precedentes”.