Ao longo dos anos o homem só tem explorado a natureza para extrair seus lucros e consumir desbravadamente. A reposição tem sido insignificante ao tamanho da depredação. Como não existe almoço grátis, o meio ambiente agora cobra um custo alto através dos efeitos da poluição, do desaparecimento de rios e dos aquíferos com a escassez de água. As catástrofes nas cidades e nos campos provocam mortes e elevados prejuízos materiais. O barato está saindo bem mais caro. Leia na íntegra.
Todos os biomas brasileiros (Mata Atlântica, Caatinga, Cerrado, Pantanal, Pampas e a Amazônia) sofrem ameaças constantes. Ai, regiões do Brasil poderão se transformar num Saara africano, uma boa forma de atrair turistas com a travessia de camelos. Os últimos governos, inclusive o do mordomo, que tem no Ministério da Agricultura um motosserra, apoiaram o desmatamento das florestas e a transposição do Rio São Francisco.
Há pouco tempo, pesquisadores brasileiros constataram que, se o índice de desmatamento do cerrado se mantiver como é hoje, em trinta anos o bioma perderá mais de mil espécies de plantas, maior extinção de vegetais da história. A revista Muito do A Tarde publicou uma entrevista sobre o assunto com o antropólogo e arqueólogo Altair Sales Barbosa, profundo conhecedor da região.
Para ele, essa extinção, em boa medida, já ocorreu e acrescentou ser uma falácia de que no cerrado ainda existem grandes quantidades de plantas. “Alguns dos subsistemas do cerrado já foram totalmente extintos, como é o caso das campinas e dos chapadões, cuja vegetação foi retirada para plantação de grãos”.
Um bom exemplo disso está bem aqui perto de nós, na Chapada Diamantina entre os municípios de Ibicoara e Mucugê onde vastas terras foram reviradas para plantação de hortigranjeiros, com a construção de barragens que provocaram grandes impactos ambientais no ecossistema.
Na avaliação do estudioso Altair Barbosa, temos hoje no máximo entre 2 e 5% de área preservada no cerrado, pequenas manchas que ainda estão intactas, localizadas em algumas reservas indígenas e outras áreas no vale do Parnaíba, entre os estados do Maranhão e Piauí, onde está sendo implantado o projeto Matopiba (plantação de grãos).
Como os rios da região estão secando, diversas plantas e árvores, como o Buriti, estão em extinção. De acordo com o arqueólogo, o modelo de agronegócio do cerrado com o uso de calcário, bem como inseticidas que matam os insetos nativos polinizadores, é altamente predatório e não leva em consideração a história evolutiva do cerrado, mais de 45 milhões de anos.
“O que ocorreu no oeste da Bahia é algo nunca visto na história. Se você pegar uma imagem aérea da região, vai ver que não existe mais nada de intacto lá” – denuncia Altair Barbosa. Segundo ele, a vegetação foi varrida do local para plantação de eucalipto e pinus que não vingaram, e só depois vieram os grãos.
Explica que essas áreas desmatadas eram de recarga dos aquíferos, e o cerrado é a maior caixa d´água da América do Sul. O que aconteceu no oeste da Bahia é algo de causar espanto, “coisa nunca visto na história da humanidade. A devastação foi tanta que vários tributários menores dos rios maiores desapareceram de maneira irreversível”. Quanto aos que existem atualmente, na sua avaliação, é só uma questão de tempo, incluindo o São Francisco.
Ele cita que os rios importantes da região, como o Grande, do Meio, Arrojado, Correntina e Carinhanha, responsáveis pela vida do São Francisco, foram mutilados de tal forma que suas nascentes avançaram em direção ao interior. A tendência é que esses rios desapareçam – sentencia.
Sobre a transposição do São Francisco, calculou que a técnica de bombeamento da água para diversos canais vai alterar a mecânica do rio que vai correr mais rápido e sugar seus afluentes com mais rapidez. Como consequência, os afluentes que correm sobre um arenito do aquífero Urucuia vão levar grande quantidade de sedimentos para o rio formando bancos de areia.
A Barragem de Sobradinho, por exemplo, no Rio São Francisco, está com apenas 10% da sua capacidade. A vazão que era de 600 metros cúbicos por segundo passou nesta semana para 550 metros cúbicos. O mar invadiu sua foz e milhares de ribeirinhos não têm mais peixe nem água doce do rio. Em várias partes, bascos de médio porte deixaram de navegar por causa das pedras e dos bancos de areia. Dentro de mais 20 ou 30 anos, o São Francisco será apenas um riacho, ou só será conhecido através de fotografias do passado.
Como saída para amenizar o problema da região, aponta que o caminho é deixar intacto o que ainda existe no cerrado para que possamos entender essa matriz ambiental de maneira global. “O problema da falta de água nas cidades será eternamente crescente. Nossos rios dependem agora da chuva e não mais dos lençóis freáticos que os abasteciam porque estes lençóis já chegaram ao nível da base”.
Nos tempos atuais, o sujeito fica o tempo todo pedindo chuva para abastecer represa. Água de enxurrada que vai encher represa, e não mais os rios perenes- diz o arqueólogo. Então, voltamos àquele ditado capitalista de que não existe almoço grátis.
Uma Resposta para “Jeremias Macário: A extinção dos cerrados…”
Espedito Maia Lima
Jeremias,
Parabéns pelo excelente artigo. Um brado de alerta é sempre importante para atingir os quase surdos ouvidos de nossas autoridades e os indiferentes comportamento de parte significativa da população, especialmente os segmentos que se apropriam dos recursos naturais no Bioma Cerrados.
A título do exemplo que você deu de Ibicoara e Mucugê, tem um Boletim de P&D da Embrapa Milho e Sorgo (datado de 2014) que informa que o Município de Mucugê tem 471 pivôs de irrigação (irrigando 32.106,78 hectares), enquanto Ibicoara tem 206 pivôs, irrigando 11.635,03 hectares.
Isso se reverte em um PIB municipal per capita elevado (acima de R$ 30 mil em Mucugê), mas com indicadores sociais ruins, dado que o PIB per capita é apenas uma média que mascara a realidade dos diferentes segmentos sociais.
Por outro lado, promove uma profunda transformação das paisagens, com uma pressão exorbitante sobre os recursos hídricos. Só lembrando que a função primeira da Barragem de Pedra do Cavalo era a regularização do Rio Paraguaçu. Atualmente ela está contribuindo muito pouco com a água que chega a Pedra do Cavalo, tamanho é o consumo de água na irrigação dos Geraizinhos da Chapada Diamantina.