Paulo Fernando de Oliveira Pires | Professor | [email protected]
De passagem pela Galeria Joaquim Correia, encontrei casualmente meu amigo Renê Barabadá. Ali mesmo, na calçada, em frente ao Terminal, o homem parecia estar aflito pra conversar urgentemente com alguém (e nesse caso, o sujeito sorteado parecia ser eu). Examinei-o em fração de segundos e notei que o seu semblante não era dos melhores. Em vista disso, fiz cara de compungido e demonstrei estar a fim de ouvir e compartilhar suas aflições. Sentindo minha expressão de solidariedade, meu amigo ficou aliviado e deitou falação em um ritmo tão alucinante que quase me perdi com a rapidez das suas frases. >>>>>
Em poucos minutos narrou um monte de coisas no melhor estilo do experiente locutor Hernani Pires Ferreira do Jockey Club do Rio de Janeiro. Sinceramente, juro que não esperava aquele Tsunami Vocabular. Sem me deixar abrir a boca, Renê soltou o verbo. Parecia um destrambelhado.
Disse-me ele: tem horas que nem gosto de ficar pensando nos momentos ruins que acontecem comigo. Sofro muito por isso. Tenho manias que não gostaria de ter, mas infelizmente as tenho e sou obrigado a conviver com elas. Uma dessas manias consiste em antecipar fatos ao ponto de mergulhar neles como se já os tivesse vivendo. Por exemplo: antecipo minha tortura só em pensar que daqui a pouco vou pegar um ônibus saindo desse Terminal, apinhado de gente indo para o Senhorinha Cairo, bairro em que moro. Ah, como isso me tortura. É um mundão de gente, um empurra-empurra, um fedor de subaqueira, mau hálito, cabelo fedorento e outras coisas que nem posso falar.
Sabe Paulo, disse-me ele – com expressão de quem exigia minha concordância – acho que o general Figueiredo do alto de sua espontaneidade quadrúpede, estava certo quando disse que gostava mais do cheiro de Cavalo do que do cheiro de Gente. E continuou falando: ônibus cheio, meu amigo, depois de um dia de trabalho, ninguém merece. E no meu caso há um agravante: chego em casa e sempre encontro minha mulher com uma cara horrorosa, mal humorada, cheia de exigências. Fala disso, fala daquilo sem que eu tenha tempo ao menos de tirar os sapatos. E começam as reivindicações. Ela sabe que a maioria das coisas que ela quer, eu não posso atender. Ela pensa que eu sou o quê? Provedor do Mundo? Sou um pequeno assalariado, você sabe de minha vida. A Vida é muito difícil, Paulo, muito difícil. Quando ele acabou de falar essa frase, aproveitei que já tinha ouvido muito, pedi desculpas, mas tinha que me retirar… Estava chegando também minha hora.
Despedi-me dele e entrei no buzú… Ao meu lado sentou-se uma moça (daquelas que Mac Donald cita como sendo capaz de fazer o barbeiro amolar a navalha na língua do freguês). Olhei pra ela e fiquei impressionado com a tranqüilidade da moça. Bonita, muito bonita. Ela nem deu TCHUM pra mim. Lembrei-me da minha idade e tomei vergonha na cara. A moça estava certa em me ignorar… Tudo bem, tudo bem … Não estou tão infeliz quanto meu amigo Renê e aprendi com Vinícius que é melhor viver do que ser Feliz… Vou levando a Vida e pensando nas coisas boas que ela oferece. É melhor viver do que ser feliz… Além disse Nelson Cavaquinho cantou: “Se eu for pensar muito na vida, morro cedo, amor. Meu peito é forte nele tenho acumulado tanta dor….”. Mamolengo Morais, o Poeta Carente sabe das coisas e a gente vai aprendendo com ele e com Deusdete, Maciel e Luciana Nery. Até a próxima semana e não esqueçam que é melhor ônibus cheio do que nenhum no Terminal.
Paulo Pires