Análise de uma Doutora da UESB: A importância sócio-econômica das pessoas “de fora” de Vitória da Conquista

Foto: BLOG DO ANDERSON

Professora Doutora Rita de Cássia Mendes Pereira | UESB

Vitória da Conquista destaca-se no estado da Bahia como centro regional de comércio e serviços e, particularmente, como polo regional de saúde e educação. Conta com, aproximadamente, 350.000 habitantes, mas, em tempos de normalidade, essa população mais do que duplica no dia-a-dia, graças ao afluxo de pessoas de dezenas de municípios do centro-sul e, mesmo, de regiões mais longínquas do estado da Bahia e até do norte de Minas Gerais. As pessoas “de fora” vêm para a cidade de Vitória da Conquista em busca de estudos, de serviços de saúde, de centros de compra e de lazer. Os grandes atacados, o comércio de rua e os shoppings centers têm nos “forasteiros” uma parte considerável dos consumidores, que para aqui se dirigem com o objetivo de abastecer suas casas e pequenos comércios locais ou, simplesmente, para satisfazer seus desejos de consumo. Leia a íntegra.

Diariamente passam pela cidade centenas de estudantes de municípios vizinhos que, em ônibus e vans, muitas vezes em situação de absoluta precariedade, procuram, nas instituições de ensino públicas e privadas que funcionam na cidade, uma profissão, um caminho para melhoria da condição de sua própria condição de vida e dos seus. Esses estudantes dão vida às faculdades e universidades e contribuem, por conta própria ou por meio de sistemas de financiamento estatais, para manter os ganhos do setor privado da educação superior.

Mal amanhece o dia, as vans e ambulâncias de outros municípios distribuem, em consultórios, clínicas e hospitais, pacientes que vêm em busca de diagnósticos e soluções para os seus problemas de saúde e que aqui deixam papéis ou recursos, muitas vezes subtraídos da pequena renda familiar, com os quais pagam as consultas, exames e tratamentos. Retornam aos seus lugares no fim do dia, não sem antes deixar algum dinheiro nas farmácias e outros pontos comerciais.

A propalada pujança da economia de Conquista está, pois, estreitamente associada à presença das pessoas que moram em outras cidades, mas que passam por aqui diariamente.

Hoje, quando enfrentamos uma grave crise sanitária, social e humanitária em decorrência da pandemia de Covid-19, querem alguns estabelecer distinção, nos números indicativos de uso dos leitos destinados ao serviço público de saúde, entre os que são da cidade e os que vêm de fora. E pretendem sustentar o projeto de retorno à “normalidade” na pequena presença de moradores da cidade nesses leitos. Escondem, para dar sustentação aos seus argumentos, que o número de leitos foi ampliado exatamente por conta da centralidade de Conquista na oferta de equipamentos e profissionais de saúde.

Atribuir a ocupação dos leitos disponíveis a uma ingerência política externa é ignorar a história do município e a contribuição, constante e importante, dos nossos vizinhos para o funcionamento da economia local e para a vida da cidade. Mas é, principalmente, ignorar o princípio da universalidade que orientou a estruturação do Sistema Único de Saúde (SUS) desde a sua criação.

Seria demais esperar outro posicionamento por parte daqueles que apostam no retorno da normalidade como caminho para a retomada das suas atividades lucrativas. Mas a incorporação desse discurso por parte daqueles que nada têm a ganhar e cujas vidas serão colocadas a prêmio só aprofunda a minha descrença na capacidade de autopreservação da humanidade.

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Possui Licenciatura em História pela Universidade Federal da Bahia (1987), mestrado em História Social pela Universidade de São Paulo (1996), doutorado em História Social pela Universidade de São Paulo (2003) e Pós-doutorado em História pela Universidade Federal da Bahia (2016). É docente do do Mestrado em Letras: Cultura, Educação e Linguagens da (Uesb) e do Mestrado em Profissional em Ensino de História na Uesb). Tem experiência de pesquisa e ensino nos campos da História Medieval, História, Leitura e Escrita e em História Social do Trabalho. É editora responsável da Revista Politeia: História


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