Destaque Internacional | jornalistas da Rússia e Filipinas, Dimitri Muratov e Maria Ressa ganham Nobel da Paz

Fotos: Reprodução | AFP

Os jornalistas Maria Ressa (Filipinas) e Dimitri Muratov (Rússia) ganharam nesta sexta-feira (8) o Nobel da Paz, por sua luta pela liberdade de expressão, anunciou o comitê norueguês, reconhecendo pela primeira vez o papel da imprensa independente. Ressa e Muratov foram reconhecidos “por seus esforços para proteger a liberdade de expressão, que é uma condição prévia para a democracia e a paz duradoura”, declarou a presidente do Comitê do Nobel, Berit Reiss-Andersen, em Oslo. Dimitri Muratov, de 59 anos, é um dos fundadores e editor-chefe do jornal russo Novaya Gazeta e “defende, há décadas, a liberdade de expressão na Rússia, em condições cada vez mais difíceis”, destacou o júri. Ex-jornalista da rede americana CNN e cofundadora do site de notícias Rappler, Maria Ressa, de 58, foi alvo, nos último anos, de várias investigações, processos judiciais e intenso cyberbullying. O Rappler já publicou matérias críticas da gestão do presidente das Filipinas, Rodrigo Duterte, abordando, inclusive, sua sangrenta e polêmica luta contra o narcotráfico.

“Nada é possível sem fatos”, afirmou Ressa em entrevista on-line transmitida pelo Rappler, acrescentando que “um mundo sem fatos significa um mundo sem verdade e sem confiança”.

A jornalista disse ter-se emocionado ao saber da premiação e garantiu que o Rappler “apenas continuará fazendo o que sempre fez”. “É o melhor momento para ser jornalista”, frisou Ressa. “Os momentos mais perigosos são também os momentos mais importante”, completou.

Em abril, Ressa foi agraciada com o Prêmio Mundial da Liberdade de Imprensa Unesco/Guillermo Cano 2021, criado em memória do jornalista colombiano Guillermo Cano assassinado em 1986.

Em 120 anos de história, o Nobel da Paz nunca havia reconhecido o trabalho de uma imprensa independente que força as autoridades a prestarem contas e contribui na luta contra a desinformação.

“As reportagens que nos ajudam a ficar informados e a ter uma ideia dos assuntos da atualidade em tempo real são essenciais para um bom debate público e para as instituições democráticas”, afirmou recentemente o diretor do Instituto de Pesquisas para a Paz de Oslo, Henrik Urdal.

A organização Repórteres Sem Fronteiras (RSF) celebrou o anúncio, “um sinal poderoso, um chamado à ação”. “Neste momento, dois sentimentos dominam: alegria e urgência”, disse o secretário-geral da RSF, Christophe Deloire, a jornalistas, na sede da organização em Paris.

“Alegria, porque é uma mensagem maravilhosa e poderosa a favor do jornalismo. Uma bela homenagem a dois jornalistas (…) que representam o conjunto de jornalistas no planeta, que assumem riscos para favorecer o direito à informação”.

“E, depois, um sentimento de urgência, porque o jornalismo se fragilizou, porque o jornalismo está sendo atacado, porque as democracias também (estão sendo atacadas), porque a desinformação e os rumores enfraquecem tanto o jornalismo quanto as democracias, e porque chegou a hora de agir”, acrescentou.

O secretário-geral da ONU, Antonio Guterres, pediu um esforço mundial pela liberdade de imprensa após felicitar os jornalistas russos pelo Nobel da Paz. “Enquanto felicitamos os premiados, que reafirmemos o esforço pelo direito à liberdade de imprensa, reconheçamos o papel fundamental dos jornalistas e reforcemos a todo nível o apoio aos jornais livres e diversos”, disse Guterres em uma declaração.

O presidente americano, Joe Biden, elogiou o trabalho dos vencedores “para expor o abuso de poder”.

Dedicado aos jornalistas assassinados

Depois de receber a notícia do Nobel, Muratov, editor-chefe do principal jornal independente russo, Novaya Gazeta, dedicou-o ao seu jornal e a seus seis jornalistas e colaboradores assassinados desde 2000.

“Não posso levar o crédito por isso. É da Novaya Gazeta. É dos que morreram defendendo o direito das pessoas à liberdade de expressão”, afirmou Muratov, citando os nomes dos seis profissionais assassinados, como Anna Politkovskaya, informou a agência russa de notícias TASS. “Como não estão conosco, (o Comitê do Nobel) decidiu, visivelmente, que eu deveria dizer isso para todo mundo (…) Esta é a verdade, é para eles”, completou.

“Teria votado na pessoa mais cotada nas casas de apostas, pessoa essa que tem todo o futuro pela frente. Refiro-me a Alexei Navalny”, declarou Muratov, citando um dos principais opositores russos.

De acordo com o jornal, uma parte do valor recebido pelo prêmio será destinado a um fundo de caridade que ajuda crianças com doenças raras. Esta organização, Krug Dobra (O Círculo da Bondade, em tradução livre), foi fundada em janeiro por iniciativa do presidente russo, Vladimir Putin.

Criada em 1993, a Novaya Gazeta costuma ser alvo de ataques e intimidações.

Pouco antes, o Kremlin elogiou a “coragem” e o “talento” do repórter.

“Felicitamos Dimitri Muratov. Trabalha sem cessar, seguindo seus ideais, mantendo-os. Tem talento e coragem”, disse o porta-voz da Presidência, Dimitri Peskov à imprensa.

Este ano, havia 329 candidatos na disputa. Entre os favoritos, estavam, por exemplo, a oposição bielorrussa, a ativista do clima Greta Thunberg e outras organizações dedicadas a proteger a liberdade de imprensa da repressão e da censura, como a já citada RSF, ou o Comitê para Proteção dos Jornalistas (CPJ).

Acertar o vencedor, ou vencedores (no máximo três), não é fácil, diante do sigilo mantido por 50 anos sobre a lista de indivíduos e organizações na disputa.

Ainda não se sabe se os ganhadores poderão se deslocar para Oslo para receber o prêmio, devido à pandemia da covid-19 e à situação em seus respectivos países.

Composto de um diploma, uma medalha de ouro e um cheque de 10 milhões de coroas (980.000 euros), o prêmio costuma ser entregue em 10 de dezembro, data de aniversário da morte de Alfred Nobel (1833-1896), seu criador.

Depois do Prêmio da Paz, o único anunciado na capital norueguesa, os membros do Nobel voltam para Estocolmo para fechar a temporada de anúncios com a última categoria, a de Economia, na próxima segunda-feira, 11.


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