Jeremias Macário de Oliveira | jornalista e escritor
A mídia tem o dever de informar, e é o seu papel criticar, mas sem distorcer os fatos. De cidade das flores, do frio, dos quebra-molas, Vitória da Conquista tem sido até chamada de “Suíça Baiana”, o que, de certa forma, não combina muito bem em se tratando de um pedaço do território brasileiro que sente os mesmos problemas de precariedade na saúde, na educação, na segurança e no âmbito social. Quando atuava no jornal “A Tarde” fui vítima de notas de repúdio quando criticava certas mazelas, como irregularidades habitacionais, desigualdades sociais, violência, inclusive policial, caos no trânsito, buraqueiras nas ruas, iluminação precária, depredação da Serra do Periperi, monumentos e patrimônio arquitetônico em degradação, entre outros pontos que diziam ser negativos para a imagem da cidade. Não poderiam ser publicados porque eram considerados como ofensas, na visão dos “críticos”. Confira a opinião de Jeremias Macário.
São estes, na maioria bairristas, que não enxergam a denúncia como instrumento de cobrar uma melhora. No entanto, tem uns veículos reféns do poder público que se sentem impedidos de falar a realidade, outros são do extremo, e ainda alguns que enfeitam o vocabulário no ar e nas imagens, que chegam a dizer que Conquista está fora do mapa da fome, o comércio aumenta suas vendas em 20, 30 e até 50% e tudo vai a mil maravilhas, na base do acho dos depoentes e otimistas de plantão.
Tem momentos que fico a imaginar que Conquista, com seus 350 mil habitantes, é um paraíso para esses últimos. A impressão que se tem é que aqui tudo é grande, como se fala da cidade de Itu, em São Paulo. Na verdade, a coisa não é assim. Tem um bom serviço de saneamento, mas ainda muita coisa a concluir, com inúmeros bairros e ruas no chão batido. Tem um povo um tanto egoísta que precisa pensar mais no coletivo.
Quero aqui dizer que conheço bem Conquista desde sua história e origens (a maioria desconhece), sua evolução econômica da pecuária, do comércio, da indústria, da política ao crescimento na educação de nível superior que foi um marco de desenvolvimento a partir do final dos anos 90 ao início dos anos 2000. Seus maiores problemas sempre foram a deficiência na infraestrutura (mobilidade urbana) e a escassez de água (racionamentos).
Quanto a fome, não tem muita coisa de diferente do resto do Brasil. Aqui, a desigualdade talvez seja mais acentuada. A riqueza é mais concentrada. Conquista tem um cinturão de pobreza que está situado na encosta da Serra do Periperi, que cresceu de uma forma desordenada a partir dos anos 60 com a vinda da BR-116 (Rio-Bahia). Aproveitaram essa construção para depredar a Serra do Periperi até meados dos anos 90 quando o local foi tombado no Governo de José Pedral.
Sobre essa questão da Serra, da qual sempre fui um crítico que desagradou muita gente, ao ponto de não olhar para minha cara, tenho um trabalho minucioso sobre sua história, plantas nativas, seu subsolo de água, visões de estrangeiros que aqui aportaram e, especialmente, a especulação gananciosa do setor imobiliário. A Serra tinha inúmeras nascentes que foram simplesmente aterradas e extintas pelas escavações na retirada de pedras e areias.
O poder público das administrações passadas foram os maiores culpados pela destruição do meio ambiente da Serra, que ainda não é bem cuidada como deveria ser. A Mata do Poço Escuro permanece sofrendo com a ação desordenada do homem que nela joga lixo e outros objetos que impactam o meio ambiente.
Visitar a Mata num final de semana é um perigo porque não tem nenhuma segurança. O rio Verruga foi aterrado, e onde está aberto, é um esgoto, uma fedentina que ninguém suporta. Mostrar esse lado é mais que um dever da mídia, embora muitos meios de comunicação preferem sobreviver na base do Ctrl “C” e do Ctrl “V,” do recortar e copiar, ou ficar passando matérias nacionais requentadas, sem o foco principal no regional. Seja rádio, televisão, jornal ou blog, queremos notícias locais da nossa terra.
Não é nenhum exagero dizer que Conquista tem um bom clima (ameno), um índice de crescimento da construção dos mais altos do Norte e Nordeste e boa qualidade de vida para se morar, mas longe de ser um paraíso por onde o mapa da fome passou por fora. Isso é um absurdo e ignorar as periferias dos bairros Pedrinhas, Panorama, Nossa Senhora Aparecida, Bruno Bacelar, Miro Cairo e tantos outros.
O número de pedintes nas ruas está aí que comprova a miséria, bem como as filas penosas nas portas dos bancos para receber o auxílio do governo federal, que não dá para quase nada. Conquista, como os mais de cinco mil municípios brasileiros, é carente na educação, na saúde e na cultura, sem falar na monstruosa informalidade do desemprego. Nem tanto chapa branca, nem tanto elogiosa que escolhe ficar nos achismos de empresários e entes do poder executivo e legislativo.