A poesia se espalhou pela Praça dos Garimpeiros, em Mucugê, e o público empolgado cantou todas as canções na noite da quinta-feira (17). Um show de ritmos nordestinos com uma brasilidade que é muito nossa: baião, maracatu, repente e cordel declamado. Chico César trouxe o show Vestido de Amor para o palco principal da Feira Literária de Mucugê (Fligê) com a maestria de um grande artista. O espetáculo começou com Beradêro, uma música política e potente, que traz versos como “no peito dos sem peito uma seta. E a cigana analfabeta lendo a mão de Paulo Freire”. Emendando com o refrão “são sons de sins” e terminando com a potência repentista de “Catolé do Rocha, Praça do Rocha, onde o homem bode berra”.A cultura nordestina exala de Chico e encanta a todos.Os sorrisos e olhos de admiração, todos em estado de poesia, vestido de amor e música.
Um público atento, cantando e fazendo coro a sequência dançante, alegre e reflexiva de Mama África, Brilho da Beleza e Pra não dizer que não falei das flores. Momento ímpar no show com as pessoas felizes entre os acordes e a dança. O corpo fala e os versos com Chico ganham a dimensão de uma suspensão temporal. A Fligê deste ano trouxe como tema a Literatura e a Música e em Chico César as duas se conectam de forma presente. Essa presença nasce das raízes nordestinas do artista, das suas influências da infância na Paraíba.
Os versos dos cantadores e repentistas, as melodias e harmonias dos acordes do cancioneiro popular nordestino e dos ritmos tão singulares da Chapada Diamantina. Para Chico, a relação entre Literatura e Música nas suas composições se dá pelo fato de que no Nordeste a palavra é muito presente na vida de todas as pessoas desde cedo, principalmente, através da literatura de cordel, das canções que os cantadores cantam no rádio, além dos improvisadores, violeiros, emboleiros e repentistas. A palavra cantada que se pratica no Nordeste é um tipo de literatura e isso fica evidente com o cordel.
Vindo de Catolé do Rocha, na Paraíba, Francisco César Gonçalves afirma que começa daí a sua ligação com a literatura. Para ele, a música e a literatura estão irmanadas, e isso fica evidente em seu trabalho como compositor, um artista que não renuncia a uma certa elaboração da palavra. Seja pela brincadeira ou pelo jogo sonoro, Chico César é um fazedor de poemas e versos que não perdem o sentido e sentimento das palavras. A Fligê é uma feira literária que prioriza a palavra em primeira instância. Para Chico César, o que o aflige não é a existência da Fligê, mas, sim, a inexistência da Fligê em cada cidade do Brasil. O nosso país tem que investir na palavra e no livro, além de despertar o gosto pela leitura e escrita, afirma o músico.