Nádia Márcia Campos Morais | Assistente Social
Temos muito o que reconstruir. Vinte anos se passaram da implantação dos sistemas das políticas públicas do Sistema Único de Assistência Social [SUAS], e do Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional [SISAN]. Somos hoje um país com mudanças substanciais pós um golpe a uma Presidenta legitimamente eleita, uma pandemia mundial e consequente morte de 700 mil brasileiros e brasileiras, e a instalação de um pensamento neofacista construído com base em informações truncadas através das redes sociais. Somos, portanto, no quesito de proteção social a pessoas e famílias empobrecidas, um país cujas ações no desenvolvimento social precisam avançar. A rede de serviços estatais e de instituições socioassistenciais privadas, precisam repensar a forma como realiza a proteção social e ampliar a modalidade de serviços a serem prestados, de forma que possam atender a atual conjuntura política, e socioeconômica instalada no Brasil pós pandemia. Confira na íntegra.
É educativo destacar que por volta de 2014, começa a se instalar no Brasil um golpe contra as instituições democráticas, através do início das Fake News, a tentativa de desmonte do Partido dos Trabalhadores, tendo como base operacional a dita Operação Lava-jato presidida pela extrema direita e divulgada pelos meios de comunicação de massa. E essa realidade inequivocamente, trouxe consequências para as políticas públicas instaladas pelos governos do presidente Lula da Silva e da presidenta Dilma Rousseff.
O governo Bolsonaro, instalado sob a égide criptofascista – denominação pejorativa cunhada para classificar àqueles que apoiam ou admiram o fascismo – desconfigurou na sua totalidade o desenvolvimento social que estava sendo consolidado, criando programas adversos ao preconizado nas políticas públicas já consolidadas e destruindo toda a rede de controle social, destituindo conselhos e interferindo no que nos é mais caro, na pactuação e destinação do financiamento dos serviços de proteção social, atingindo na ferida da execução dos serviços que é o financiamento; não há serviços sem o devido financiamento. Destaca-se que aquele governo não destruiu na sua totalidade o SUAS, tão somente pela luta da militância que conseguiu, com poder de convencimento aprovar por unanimidade na Câmara Federal e no Senado a Lei nº 12.435, de 6 de julho de 2011, que altera a Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993, e que dispõe sobre a organização da Assistência Social; caso não houvesse tal investimento de cada um de nós militantes, que realizamos reuniões com deputados e lideranças políticas informando da importância do SUAS para o Brasil naquele ano de 2011, certamente o governo anterior, equivocado na sua essência, teria desmantelado todo trabalho construído desde a instalação da PNAS – Politica Nacional de Assistência Social em dezembro de 2004.
Por tudo isso, desde 2022, nosso papel como militantes, gestores e gestoras da assistência social, dos direitos humanos, da segurança alimentar, é reconstruir todo o arcabouço de controle social e financiamento para voltar a fazer funcionar sistemicamente o desenvolvimento social e os sistemas a ele atrelados.
O presidente Lula assegura que, “Só o conhecimento é capaz de fazer frente ao obscurantismo”, isso implica que o processo de melhoria das condições de vida das pessoas, exige, doravante, um planejamento de desenvolvimento social que tenha como base o comprometimento com o projeto democrático na perspectiva da educação popular – educação essa que objetiva fortalecer a autonomia e o desenvolvimento das capacidades de indivíduos e famílias. O desenvolvimento social precisa ser posto como um processo que vai além da implementação dos benefícios e serviços socioassistenciais, mas que implica em promover a participação popular nas decisões e a politização dos agentes governamentais e institucionais dos serviços de atendimento à população. Um desenvolvimento social que propõe a realizar mudanças nessa atual conjuntura criptofascista, não pode prescindir de fortalecer o controle social, a participação comunitária e, principalmente, a educação popular.
Em Vitória da Conquista, esse município baiano de 370mil habitantes, 3º maior município da Bahia e considerada a capital do sudoeste baiano, no momento atual de pré-campanha para eleição às vagas de prefeito e vereadores, conta com o Partido dos Trabalhadores e partidos aliados formando uma frente que pleiteia ocupar a cadeira da prefeitura, ocupada atualmente por um grupo que coadunou com o governo Bolsonaro. Neste tempo é, portanto, apresentar uma proposta de mudança na gestão municipal como pauta na disputa eleitoral para outubro próximo.
Vitória da Conquista tem hoje 50.45 mil famílias recebendo a transferência de renda do PBF – Programa Bolsa Família, perfazendo 43% da população, se considerarmos a média de 3 pessoas por família; sendo o PBF o programa norteador para construção dos programas e serviços que constituem o desenvolvimento social que é um grande guarda-chuva de políticas públicas de atendimento as demandas conjunturais do município. Diante desse quadro, não há como continuar a atender as vulnerabilidades sociais apenas com transferência de renda e/ou com atendimentos de proteção social, haverá de se promover e garantir efetivamente a segurança alimentar e nutricional, a geração de trabalho e renda – fatores emancipatórios urgentes e necessários; e, ao se considerar o preponderante envelhecimento populacional, a implantação de uma política municipal de cuidados, de instalação de centros dia, e outras possibilidade a serem construídas com a escuta da população e referendo dos conselhos afins, que visam atender pessoas que precisam de cuidado e aquelas que cuidam, na sua maioria mulheres e dessa maioria, mulheres negras. Não minimizando, mas sim, pelo contrário, a proteção social a ser efetivada àquelas questões da área dos direitos humanos.
Escutar as pessoas é ponto pacífico. São as pessoas que podem falar de suas faltas e dos seus sonhos subjetivos e objetivos da busca por uma vida melhor e mais digna. Cabe a classe trabalhadora, além de lutar para vencer o sistema capitalista assolador, sonhar; cabe ao governo atuar para que esses sonhos sejam construídos na realidade concreta e se tornem conquistas da classe trabalhadora. Não há alternativa libertadora e emancipatória sem a participação da população pensando e propondo o que de fato necessitam para suas vidas e para a sua organização comunitária. De adianto a isso o PGP – Programa de Governo Participativo, uma tecnologia social do Partido dos Trabalhadores, ocorrido em Vitória da Conquista nos primeiro semestre deste ano eleitoral, escutou a população identificando tecnicamente onde cada proposta, reclamação, dúvida e sonho, caberá na construção de um programa de governo que atenda as demandas da população.
Uma política de desenvolvimento social em Conquista não mais poderá acontecer sem considerar o caráter intersetorial e interinstitucional formalizado a partir de leis municipais entre as demais políticas públicas e as organizações sociais, contando necessariamente com a participação da população – o que implica ampliar o controle social através dos conselhos locais atrelados aos Conselhos Municipais. Neste bojo se fará necessário instalar uma ação coletiva de proteção social a população, incluído a população e suas demandas e decisões; os serviços das políticas publicas de saúde, educação, trabalho e renda, habitação, segurança alimentar, direitos humanos, meio ambiente e as organizações sociais e empresas que tenho o caráter de interesse social; Essa reorganização será necessária e para que ocorra o funcionamento adequado dos serviços e para tanto se faz necessário a implantação de uma política de recursos humanos que assegure o trabalho descente aos agentes públicos, trabalhadores e trabalhadoras que atendem e assistem as necessidades geradas pelas mais variadas situações de carência socioeconômicas da população.
A atuação a ser proposta pelo município frente ao desenvolvimento social haverá de perder o caráter apenas assistencial para adentrar a esfera das políticas sociais formalizadas em legislações construídas através da participação popular. governo Um Sendo o governo municipal assumido por um grupo político progressista, precisa estar atento que, para vencer a conjuntura criptofascista, será preciso lançar mão do direito positivo – conjunto de regras e leis que regem a vida social e as instituições – objetivando construir uma proposta de desenvolvimento social com a comunidade, que inclua todas as tecnologias sociais de participação popular e controle social que rompam com o paternalismo, fazendo saber a cada cidadão o seu direito de acessar benefícios quando dele necessitar e conscientizando-os que o desenvolvimento social tem como proposta, através dos seus serviços, construir uma sociedade mais justa e igualitária.
Vitória da Conquista, 09/07/2024.
Nádia Márcia Campos Morais
Assistente Social
Já ocupou as funções de Superintendente de Assistencial Social do Estado da Bahia. de Secretária Municipal de Desenvolvimento Social de Vitória da Conquista e de Coordenadora Nacional do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil no Governo Dilma Rousseff
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