Gildelson Felício de Jesus
Começou no último dia 5 e vai até o dia 3 de abril de 2020, o período em que a legislação eleitoral “abre a janela partidária” (período em que é permitido a um vereador poder mudar de partido político sem perder o mandato em curso), haja vista que o mandato de um parlamentar (vereadores e deputados) pertence ao partido político em que o mesmo foi eleito (Lei nº 13.165/2015; Resolução TSE nº 23.606/2019). O artigo 24 da Lei dos Partidos Políticos (Lei nº 9.096/1995) determina, inclusive, o seguinte: “Na Casa Legislativa, o integrante da bancada de partido deve subordinar sua ação parlamentar aos princípios doutrinários e programáticos e às diretrizes estabelecidas pelos órgãos de direção partidários, na forma do estatuto.” Leia na íntegra.
Por que o mandato pertence ao partido político e não ao parlamentar? A rigor, a legislação vigente tem essa previsão. Legislações à parte, vamos dar um exemplo concreto de como é eleito matemática e legalmente um vereador em Vitória da Conquista para verificarmos a justeza de que o mandato do parlamentar tem que pertencer ao partido político em que o então candidato foi eleito.
Como é sabido, a Câmara de Vereadores de Vitória da Conquista tem 21 vereadores/as e, atualmente, o município tem uma estimativa de que 230 mil eleitores estejam aptos a votar nas eleições de 4 de outubro deste ano. A conta é bem simples, bastaria dividir o número de eleitores pelo número de vereadores e obteríamos como resultado o número de votos para eleger um vereador (230.000 ÷ 21 = 10.952). Todavia, essa conta não espelha a realidade objetiva, pois essa divisão, chamada de quociente eleitoral, considera apenas os votos válidos (votos nominais + votos na legenda de um partido).
Assim, supondo que os votos válidos sejam aproximadamente 75% dos eleitores aptos em Vitória da Conquista (172.500 eleitores), teríamos um quociente eleitoral de 8.214 votos para eleger um vereador (172.500 ÷ 21 = 8.214). Ou seja, com os 172.500 votos válidos divididos pelas 21 vagas de vereadores, obtemos o número de 8.214 votos, que seria um suposto quociente eleitoral.
Salvo engano, nos últimos 40 anos, nenhum candidato a vereador em Vitória da Conquista obteve sozinho o quociente eleitoral, por isso a importância dos partidos políticos e a chapa de candidatos a vereador com uma representatividade que obtenha, no mínimo, o quociente eleitoral para eleger pelo menos 1 vereador. Em 2016, por exemplo, a candidata mais votada obteve quase 3.800 votos (aproximadamente metade do quociente eleitoral), o eleito com menos votos obteve próximo de 1.000 votos e, ainda, teve candidato que obteve quase 2.400 votos e não foi eleito porque o partido só conseguiu atingir a votação para uma vaga, considerando que o quociente eleitoral na época foi 7.865 votos. Dessa forma, todos/as os/as vereadores/as eleitos/as dependeram da votação do conjunto de candidatos do seu partido para obter aquela vaga. Essa é uma primeira conta que os partidos e os candidatos a vereador precisam entender e, na minha opinião, um dos motivos que justificaria o mandato pertencer ao partido. Vamos à segunda conta.
Considerando ainda a legislação eleitoral em vigor e o auxílio da matemática, os partidos e os pré-candidatos a vereador precisam fazer contas e utilizar um razoável raciocínio lógico para fazerem suas escolhas e obterem êxito na eleição para vereador. Pela experiência de eleições anteriores, quando há uma polarização entre dois candidatos a prefeito, a tendência é que as chapas de vereadores desses candidatos privilegiem alguns nomes, além de atrair candidatos com potencial eleitoral. Dessa forma, geralmente, são eleitos/as candidatos/as com votação superior a 1.700 votos, ficando possível prever os possíveis eleitos, pois, geralmente são eleitos 4 vereadores entre os 6 ou 7 candidatos considerados “mais fortes”. Por isso, muitos candidatos com votação abaixo dessa média, ao passar pela experiência de não serem eleitos (apesar da expressiva votação), em uma eleição seguinte buscam um partido em que possam ser eleitos com o potencial médio dos seus votos. Com efeito, é, nesse período, que ocorre o “troca troca” de partidos. Em outras palavras, os candidatos, de modo pragmático, buscarão se abrigar na legenda que melhor chance lhe ofereça para ser eleito.
Um dos problemas é que os partidos não poderão fazer coligação proporcional. Apesar da existência de muitos partidos, nem todos têm estrutura e organização burocrática para cumprir os ritos legais e apresentar uma chapa de vereadores completa ou que atinja o quociente eleitoral para fazer pelo menos 1 vereador. Em Vitória da Conquista, nesse pleito, cada partido poderá apresentar no máximo 32 candidatos/as a vereador/a (150% do número de vagas da Câmara), sendo, no mínimo 30%, do sexo oposto. Logo, não é uma equação tão simples para amadores ou partidos sem experiência.
É nesse cenário, que, por um lado, com o pragmatismo pessoal (do candidato) e partidário, cada vez mais temos menos candidatos ideológicos e mais “partidos de aluguel” que conduzem a sigla como um negócio de interesses pessoais. O eleitor, então, deve ficar atento e ser mais cuidadoso com o seu voto para não contribuir com quem não gostaria de ver eleito. Por outro lado, temos alguns poucos partidos, a exemplo do PSB, com experiência de mais de 30 anos participando das eleições em Conquista, que estabeleceu critérios ideológicos mínimos para seus candidatos a vereador: Ser oposição ao Governo Bolsonaro e não apoiar a reeleição do prefeito Herzem em Conquista.
Outro aspecto que poderá viabilizar um maior equilíbrio da sua chapa de vereadores e uma responsabilidade coletiva é a opção estratégica de construir uma chapa com 32 candidatos que oscilem em votações média de 300 a 1.200 votos cada um, projetando a possibilidade da eleição de 2 ou 3 vereadores pelo PSB.
Via de regra, a escolha de um candidato deveria ser pautada em princípio éticos e o eleitor, conhecedor dos seus direitos e deveres, deveria direcionar o seu voto com afinidade ideológica e voltado para os interesses coletivos. Infelizmente, muitos partidos e candidatos continuam fazendo a politicagem “do quem dá mais” e com recursos de origem duvidosa. Isso tem levado parte dos eleitores a generalizar a política como uma atividade criminosa e/ou de promiscuidade.
Por fim, a eleição de um/a vereador/a depende da escolha dos eleitores, mas, antes, depende da escolha que o candidato vai fazer do seu eventual partido político para se habilitar com chances junto ao seu eleitorado. Com efeito, o candidato a vereador que não fizer conta e não usar o mínimo de raciocínio para compreender as contradições e complexidades do mundo da política pode já começar derrotado. Participar da política é correr riscos pessoais em defesa dos interesses coletivos, mas parte dos riscos podem ser mensurados. Vamos fazer e refazer contas, porque matemática e política têm tudo a ver!
Gildelson Felício de Jesus é professor da Matemática da Universidade do Estado da Bahia (UNEB)